Por Francisco Alison Silva Aquino
Há uma tendência da parte de muitos intérpretes em ver a descrição de Paulo acerca da eleição como sendo exclusivamente corporativa. Mas uma análise mais precisa indica que a eleição em vista é ao mesmo tempo corporativa e individual.
Que a eleição é corporativa é indiscutível, uma vez que Deus escolheu sua igreja antes da fundação do mundo, sendo ela composta de judeus e gentios crentes conforme Paulo nos diz em Ef 2.14, 16. O problema é interpretar a passagem como sendo de caráter corporativo apenas e não individual. Mas analisemos a perícope em questão.
Paulo nos diz que Deus “nos elegeu nele [em Cristo] antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis diante dele em amor”. Alguns interpretam a passagem como significando que Deus escolheu um povo, isto é, a igreja, como um conceito abstrato, mas que não escolheu individualmente quem fará parte desse povo. Mas antes de entrar na análise exegética propriamente dita, analisemos uma ilustração proposta por Thomas Schreiner a fim de entendermos se a eleição corporativa faz sentido:
“Suponha que você diga: “Eu vou escolher comprar um time de baseball profissional.” Isto faz sentido se você então compra o Minnesota Twins ou o Los Angeles Dodgers. Mas se você faz isto, você escolhe os membros daquele time específico sobre outros jogadores individuais em outros times. Não faz sentido dizer: “Eu vou comprar um time de baseball profissional” que não tem membros, sem jogadores, e então permite que quem desejar vir jogue no time. No último caso, você não escolheu um time. Você tem escolhido que haja um time, a composição do que está totalmente fora do seu controle. Então escolher um time requer que você escolha um time entre outros juntamente com os indivíduos que o compõem. Escolher que haja um time não implica na escolha de um grupo sobre outro, mas apenas que um grupo pode formar em um time se eles quiserem. O ponto da analogia é que se há realmente tal coisa como a escolha de um grupo específico, então a eleição individual está implicada na eleição corporativa.”[1]
A ilustração em si demonstra que uma eleição exclusivamente corporativa não faz sentido. Mas vejamos mais algumas considerações de caráter exegético para a fundamentação da concepção de uma eleição individual.
O versículo posterior nos diz que Deus “nos predestinou para sermos filhos de adoção por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o beneplácito de sua vontade”. O que temos aqui é a doutrina da adoção. Certamente ninguém afirmaria que indivíduos não são adotados ou que Cristo redimiu por meio do seu sangue a igreja corporativamente. Mas que Deus adotou indivíduos, redimindo-os individualmente.
Uma passagem paralela a Efésios 1.4 é Romanos 8.30 que diz: “e aos que predestinou, a estes também chamou; e aos que chamou, a estes também justificou; e aos que justificou, a estes também glorificou.” Todos creem que as bênçãos aqui como o chamado e a justificação, por exemplo, são individuais. A pergunta é: que sentido faria interpretar essas bênçãos como sendo individuais e a eleição como exclusivamente corporativa? Nenhum! Isso iria contra os princípios elementares da hermenêutica.
Outra razão pela qual a interpretação de que a eleição é apenas corporativa não faz sentido é o que está expresso no verso 13 que diz: “no qual também vós, tendo ouvido a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, e tendo nele também crido, fostes selados com o Espírito Santo da promessa.” Certamente ele está falando a indivíduos bem como à igreja enquanto entidade corporativa. Ninguém diria que a igreja é selada com o espírito santo corporativamente, mas que cada um que crê é selado individualmente.
Analisando Ef 1.4, Forster e Marston afirmam:
“Nós somos escolhidos em Cristo. Isto não significa que nós fomos escolhidos para sermos colocados em Cristo. Isto significa que quando nós nos arrependemos e nascemos de novo no corpo de Cristo, nós participamos do seu povo eleito.”[2]
No entanto, o texto não diz que Cristo foi eleito como alguns interpretam. O objeto do verbo “escolher” é “nos”. Além disso, quando o texto diz “nos escolheu nele” isto provavelmente significa que Deus escolheu que a salvação seria experimentada “através de Cristo”. Ele é o agente e a pessoa através de quem a obra eletiva de Deus se concretizaria.
Um comentário de Steve Hays é crucial para o entendimento do texto em questão. Ele diz:
“A eleição corporativa pressupõe eleição individual. “Escolher” aqui significa selecionar de um grupo, não selecionar um grupo abstrato cujos membros são completados depois. A objeção arminiana significa dizer que Deus escolheu Cristo e que qualquer um que escolhe Cristo está “em Cristo”. Ok, então por que alguém escolhe Cristo? O texto diz que Deus nos predestinou — não Cristo, mas os indivíduos — para ser adotados como seus filhos através de Jesus Cristo.”[3]
Uma análise do verbo grego pode nos ajudar a compreender melhor o texto. Steve Hays prossegue:
“O verbo (eklego) normalmente toma um objeto definido: Cristo escolheu os doze apóstolos (Lc 6.13; Jo 6.70; 13.18; At 1.2). O pai escolheu o filho (Lc 9.35). A igreja escolheu Estêvão (At 6.5). A igreja escolheu Silas e Barnabé (At 15.22). Não há, então, presunção de que o verbo não toma um objeto definido e/ou tem uma classe plural, abstrata em vista. A noção de escolha do senso comum é geralmente construída para significar “selecionar de um grupo,” não “selecionar um grupo”. O uso bíblico simplesmente confirma esta noção.”
Neste sentido, concluímos que o entendimento de que a eleição é exclusivamente corporativa não se sustenta dada a análise exegética do texto aqui tratado. Uma análise mais cuidadosa do texto aponta para uma eleição não só corporativa, mas individual também. Ou seja, Deus escolheu, antes da fundação do mundo, aqueles que fariam parte da sua igreja, os quais seriam redimidos pelo sangue do mediador e salvador Jesus Cristo.
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Notas:
[1] Disponível em http://pelocalvinismo.
[2] Forster and Marston, God's Strategy 97
[3] Disponível em http://pelocalvinismo.
Fonte: Pelo Calvinismo
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