quarta-feira, 12 de julho de 2017

GORDON CLARK SOBRE OS PROBLEMAS DO EMPIRISMO – DOUG DOUMA

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O empirismo tem sido, e é, uma epistemologia proeminente entre filósofos seculares e cristãos. Ele é frequentemente aceito como a epistemologia do senso comum, mas certamente não deixou de ter os seus detratores na história da filosofia. Muitos filósofos gregos antigos, entre eles Platão e Plotino, criticaram o empirismo como sendo insustentável. O pensamento cristão primitivo, como exemplificado em Santo Agostinho, também se opunha em grande parte ao empirismo.

Parte dessa tradição agostiniana foi seguida amplamente por Gordon Clark. Os argumentos contra o empirismo constituem uma parcela significativa das obras de Clark. A razão para tal ênfase é clara: as várias formas de empirismo, todas elas das quais Clark demonstrou considerar falsas, dominavam o cenário filosófico de seus dias (e continuam a fazer isso hoje). Clark sabia que os argumentos contra o empirismo feitos pelos antigos gregos não haviam sido refutados, mas simplesmente ignorados.

Definindo o empirismo, Clark escreveu: O empirismo, estritamente falando, é a teoria da epistemologia que baseia todo o conhecimento apenas na experiência ou na sensação[1]. Quanto a teoria do empirismo: (1) no nascimento a mente humana está em branco e (2) as sensações são um fator básico. Em seguida, (3) infere-se as percepções das sensações. Essas percepções são então (4) armazenadas na mente como imagens de memória das quais (5) se abstrai ideias ou conceitos.

Clark não criticou o empirismo somente em algum desses pontos, mas em cada um deles.

1. Uma mente que está em branco não possui capacidade para processar sensações. Na verdade, uma mente vazia não é, de fato, uma mente. O processo do empirismo nem sequer pode começar.

2. Os sentidos não são confiáveis. O primeiro passo para uma teoria empírica do conhecimento é a aquisição de dados brutos através dos sentidos. Para que esse processo seja bem sucedido os sentidos devem ser confiáveis. Mas, segundo Clark, os sentidos muitas vezes enganam, e apenas um único engano dos sentidos já é suficiente para produzir dúvidas sobre eles. Clark disse: Se num caso criminal uma testemunha demonstra haver cometido perjúrio de si mesma, quanto crédito você dará às outras indicações que ela faz? Se os seus olhos te enganam, então você não pode acreditar nisso[2].

3. (a) É impossível distinguir uma percepção válida de uma percepção inválida. Clark escreveu: Em algum momento uma pessoa tem as impressões de vermelho, suave, doce, e dezenas de outras. Para perceber uma coisa, essas sensações devem ser combinadas. Não que ninguém sequer veja um cão ou uma árvore. Um cão não é apenas preto; ele é macio também, e felpudo, e talvez tenha um odor; combine isso, e só então você terá uma percepção do seu animal de estimação. No entanto, não há nada nas qualidades em si que o obrigue a selecioná-las particularmente e descartar as dezenas de outras que estão presentes no mesmo momento. Por que não selecionar o felpudo, o som de Si bemol, e o gosto de Bacardi rum, tudo o que se sente no mesmo momento, e combiná-los no objeto percebido?[3].

3. (b) Empirismo não pode determinar indivíduos. “Essa montanha maciça [Monte Blanca] se encontra na extremidade sul da Cordilheira Sangre de Cristo. Seria ela realmente uma coisa, um indivíduo, uma realidade primária? Se todo intervalo for a realidade primaria então o Monte Blanca não é uma coisa real. O pior é que, se formos ainda mais longe, a Cordilheira Sangre de Cristo pode não ser uma coisa, mas apenas parte de toda cadeia de montanhas rochosas, talvez incluindo os Andes também. Qual seria então o indivíduo: a rocha, a montanha ou a cordilheira? A pergunta é embaraçosa, pois a identificação de indivíduos não pode ser feita sobre a base empírica que Aristóteles adota[4].

4. Nem todo mundo tem imagens de memória.

5. O empirismo não pode produzir proposições universais. O método que os empiristas empregam para produzir proposições universais é feito com base em generalizações de um número limitado de experiências sensoriais individuais. Este é o método da indução. Proposições universais são aquelas que atribuem uma característica comum a todos os itens de um mesmo tipo, como: todos os homens são mortais. A indução, entretanto, comete a falácia lógica conhecida como “afirmação do consequenteEssa falácia é a tentativa de raciocinar da seguinte maneira:

P1. Se A, então B
P2. B
C. Portanto, A

Por meio de um exemplo pode-se ver claramente como esse raciocínio é falacioso.

P1. Se estou em Atenas, então estou na Grécia
P2. Eu estou na Grécia
C. Portanto, estou em Atenas

Isto é falso, pois minha presença na Grécia poderia ser em Esparta, ou em Tessalônica, ou em qualquer área não-ateniense do país. Igualmente, é dessa mesma forma falaciosa que a indução da experiência sensorial conclui proposições universais. Na base da indução um cientista pode reivindicar, todos os emus não voam. Onde A = todos os emus não voam, e B = todos os emus observados não voam.

P1. Se todos os emus não voam, então todos os emus observados não voam
P2. Todos os emus observados não voam
C. Portanto, todos os emus não voam

Suponha que eu veja um emu que não voa, posso dizer com razão: Todos os emus não voam”? Ou talvez eu veja dois emus que não voam, ou três, ou um milhão. Em que número de experiências está justificada a conclusão “todos os emus não voam”? Assim como é falso afirmar uma proposição universal a partir de uma única experiência, igualmente é falso afirmar uma proposição universal a partir de qualquer número finito de experiências. É com um número finito de observações que os físicos afirmam que todos os nêutrons pesam 1 unidade de massa atômica e os químicos afirmam que duas substâncias particulares misturadas produzem sempre a mesma reação. Em cada afirmação da ciência se usa indução, e em cada caso é uma falácia.

Clark, em muito poucas palavras, escreve: O empirismo não pode produzir nem justificar qualquer proposição universal. A explicação é óbvia: a experiência nunca é universal[5]. 

Além desses problemas ao longo da trajetória do empirismo das sensações às idéias, Clark sustentou que existem outras questões gerais que afetam o empirismo.

A. O empirismo não pode estabelecer a lei da contradição. Clark escreveu: A validade do raciocínio silogístico nunca pode se basear na experiência [...] O empirismo, portanto, é conclusivamente manifesto como cético, porque a lei da contradição não pode ser abstraída ou obtida a partir do particular temporalmente condicionado[6]. 

B. Conclusões normativas não podem ser deduzidas de premissas descritivas e assim o empirismo não fornece nenhuma ética. Clark sustentou que o empirismo não suporta qualquer posição ética porque não consegue superar o Problema do É-Dever. Este é o problema de que um dever não pode ser determinado a partir de um “é. Em outras palavras, a partir de premissas descritivas não se pode formar conclusões normativas. Por meio do que se observa no mundo, não se pode concluir como devemos agir.

Não só o empirismo não pode apoiar uma teoria ética, mas também não pode produzir qualquer teoria de estética, qualquer teoria do que é bom ou do que é belo.

Essas limitações fazem do empirismo uma filosofia inferior àquelas que podem produzir teorias da ética e estética. Clark sustentou que o Problema do É-Dever é superado na ética bíblica. Ele escreveu: Independente do empirismo descritivo, a ética teísta começa com proposições normativas e escapa da falácia de introduzir termos em suas conclusões que não estavam presentes nas premissas[7].

C. O empirismo resulta em solipsismo, o que torna a comunicação impossível. Clark escreveu: Nenhum de nós dois pode ter o mesmo pensamento, porque todo pensamento é uma experiência puramente pessoal. Isso torna a comunicação impossível. Em linguagem técnica, o empirismo resulta em solipsismo[8].

D. O empirismo é auto-contraditório. Por fim, a afirmação de que o conhecimento só vem de experiência sensorial não pode vir de experiência sensorial. Pelos seus próprios méritos, o empirismo deve ser rejeitado.


Um último argumento que Clark fez não será de muito interesse para os não-cristãos, mas há muitos empiristas cristãos que devem tomar cuidado: o empirismo é incompatível com a Bíblia. Clark escreveu: As Escrituras não discutem o empirismo como tal, mas a doutrina da imagem de Deus no homem, a lei gravada no coração dos gentios e a transmissão do pecado original indicam uma herança inata e não-empírica, que exclui essa filosofia[9]. Além disso, Clark escreveu: Mas, certamente, o argumento mais conclusivo de Gênesis se concentra no termo ‘imagem. Se Adão foi feito a imagem de Deus, ele não poderia ter uma mente vazia pela simples razão de que a mente de Deus não é um espaço em branco [...] O relato de Gênesis claramente refuta o empirismo de tal modo que nada mais é logicamente necessário. Mas a Bíblia fornece detalhes adicionais. O que está implícito em Gênesis é expandido em Efésios 4:24 e Colossenses 3:10. Essas duas passagens, ao explicarem a regeneração como uma espécie de nova criação, ensinam que o homem foi originalmente criado no conhecimento e na justiça[10].



Notas:
[1] Gordon H. Clark. “Empiricism” in Encyclopedia of Christianity. Edwin A. Palmer, ed. Wilmington, Delaware: National Foundation for Christian Education. 1968.
[2] Gordon H. Clark, “What is Apologetics,” The Gordon-Conwell Lectures on Apologetics, 1981. minute 36.
[3] Gordon H. Clark, Language and Theology (Phillipsburg, NJ: Presbyterian and Reformed Publishing Company, 1980), p.134.
[4] Gordon H. Clark, An Introduction to Christian Philosophy, p.31.
[5] Gordon H. Clark, Lord God of Truth (Hobbs, NM: The Trinity Foundation, 1994), p.35.
[6] Gordon H. Clark, A Christian View of Men and Things (Grand Rapids, MI: William B. Eerdmans Publishing Company, 1952), p.308.
[7] Gordon H. Clark, “The Achilles Heel of Humanism.” [Publicado em The Witness, June-July 1950, pp.5-6, 19. Leia na fundação da Evangelical Theological Society in 1949].
[8] Gordon H. Clark, Three Types of Religious Philosophy (Nutley, NJ: The Craig Press, 1973), p.121.
[9] Gordon H. Clark. “Empiricism” in Encyclopedia of Christianity. Edwin A. Palmer, ed. Wilmington, Delaware: National Foundation for Christian Education. 1968.
[10] Gordon H. Clark, The Clark-Hoover Debate, minute 14-15.



Extraído de:http://scripturalism.com/gordon-clark-on-the-problems-of-empiricism/

Traduzido por: Dione Cândido Jr.

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