sábado, 23 de maio de 2015

Abecê da hermenêutica


Hermenêutica é a ciência, ou técnica, que tem por objetivo interpretar textos. A exegese pode ser considerada como um produto da hermenêutica. Sempre que lemos a Bíblia e entendemos a sua mensagem, principalmente quando juntamos vários trechos que tratam do mesmo assunto, estamos fazendo uma exegese do(s) texto(s) através das ferramentas oferecidas pela técnica hermenêutica.[1]

Eu costumo comparar a hermenêutica bíblica com o Cubo de Rubik, também conhecido como Cubo Mágico. O primeiro protótipo do cubo foi fabricado em 1974 quando Ernő Rubik era professor do Departamento de Desenho de Interiores da Academia de Artes e Trabalhos Manuais Aplicados de Budapeste (Hungria). Quando Rubik criou esse quebra-cabeça, a sua intenção era criar uma peça que fosse perfeita, no que se refere à geometria, para ajudar a ilustrar o conceito da terceira dimensão aos seus alunos de arquitetura. A primeira peça que realizou foi em madeira e pintou os seus seis lados com seis cores distintas, para que, quando alguém girasse as faces do cubo, tivesse uma melhor visualização dos movimentos realizados.[2]

Você manuseia o cubo girando suas camadas, e o objetivo é montar cada uma de suas faces com a mesma cor depois de embaralhado. Montar um dos lados é muito simples, a coisa toda fica complicada quando precisamos montar os outros lados sem desmontar o lado que já foi resolvido. Se para montar um lado, você desmonta o outro, alguma coisa está errada com a técnica empregada na solução do problema, e não será possível alcançar o resultado final do quebra-cabeça. 

Na hermenêutica, encontramos a mesma realidade. Se para desenvolver a compreensão de um determinado texto, você compromete de alguma forma a compreensão de outros textos, algo está errado, e você não deveria prosseguir. Vamos tentar analisar um exemplo prático. 

Imagine que um dos lados do cubo seja a epístola de Tiago, e outro lado qualquer seja a carta de Paulo aos Romanos. Ao lermos a epístola de Tiago isoladamente, poderemos até concluir que a salvação seja resultado das obras, e aqui teríamos a montagem de um dos lados do Cubo Mágico. Ao lermos a carta de Paulo aos Romanos, chegaremos à conclusão de que ninguém será salvo por meio das obras. A montagem desse segundo lado em Romanos desmontará o lado já construído em Tiago. A conclusão óbvia é que algo está errado. 

Montaremos os dois lados simultaneamente quando a conclusão for a seguinte: não fazemos obras para sermos salvos, mas uma vez salvos, faremos as obras. Logo, Paulo estava dizendo em sua carta aos Romanos de que ninguém será salvo pelas obras, mas Tiago alertou-nos em sua epístola de que se somos salvos, deveríamos então apresentar os frutos dessa salvação: as obras. Seria como se Paulo estivesse contemplando naquele momento apenas um lado do cubo e, em sua descrição, ele diria que é “vermelho”; Tiago estaria olhando o outro lado do cubo, descrevendo-o como “azul”. 

Portanto, eles contemplavam o cubo perfeitamente montado, mas cada um descreveu apenas um dos lados. Quando pegamos o Cubo Mágico (a Bíblia) ele pode nos parecer embaralhado, mas é perfeitamente possível, com o auxílio da hermenêutica, encontrar a solução em que o cubo apresentar-se-á com os dois lados montados. 

Essa comparação da hermenêutica com o Cubo Mágico ocorreu-me outro dia quando ainda lecionava na EBD, e precisei fazer com que meus alunos entendessem rapidamente como harmonizar os diversos textos bíblicos evitando as divergências aparentes, mas que verdadeiramente não estão lá. Acredito que essa comparação é válida para quem nunca teve contato com esse tipo de estudo (hermenêutica), e pode ser o princípio de uma boa regra para interpretar os textos bíblicos antes de aprofundar-se nas técnicas da hermenêutica. 

Não tenho mestria no assunto, portanto, não tenho a pretensão de trabalhar o texto além deste ponto, da comparação da hermenêutica com o Cubo Mágico. Há tantos livros de mestres da hermenêutica à disposição no mercado que me sentiria como que “chovendo no molhado”. 

Assim sendo, se você realmente se interessou pelo assunto, basta seguir minha recomendação inicial de leitura e ir avançando nos estudos depois. Recomendo a leitura na ordem que segue: 
  • Manual Popular de Dúvidas, Enígmas e "Contradições" da Bíblia.  - Norman Geisler & Thomas Howe / Editora Mundo Cristão
  • Hermenêutica - Princípios de Interpretação das Sagradas Escrituras - E. Lund & P. C. Nelson / Vida Acadêmica 
  • Princípios de Interpretação Bíblica - Introdução à hermenêutica com ênfase nos gêneros literários. - Vilson Scholz / Editora da ULBRA 
  • Os Perigos da Interpretação Bíblica - A exegese e suas falácias. - D. A. Carson / Vida Nova 

Autor: André R. Fonseca

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