quinta-feira, 15 de maio de 2014

O que fazer quando não há uma verdadeira Igreja onde você vive




por John Knox


Conselhos saudáveis ​​de uma carta de John Knox dirigida a seus irmãos na Escócia. 

Meus queridos irmãos, não tanto para instruir-lhes como deixar-lhes algo do testemunho de meu amor por vocês, eu considerei como algo bom a comunicar-lhes meus débeis conselhos de como eu quero que se conduzam no meio desta geração maligna e perversa, no que diz respeito ao exercício da santíssima Palavra de Deus, sem a qual não se pode aumentar o conhecimento, nem se pode desenvolver a piedade, nem pode continuar o fervor espiritual entre vocês. Porque, assim como a Palavra de Deus é o princípio da vida espiritual, sem a qual toda a carne está morta na presença de Deus, e como é lâmpada para os nossos pés, sem cuja luz toda a posteridade de Adão anda em trevas, e como é o fundamento da fé, sem a qual ninguém pode compreender a boa vontade de Deus, assim também é o único órgão e instrumento que Deus usa para fortalecer os fracos, para confortar os aflitos, para trazer debaixo de misericórdia pelo arrependimento aqueles que se desviaram, e, finalmente, para preservar e guardar a mesma vida na alma contra todos os ataques e tentações.

Portanto, se vocês querem que vosso conhecimento cresça, que a vossa fé seja confirmada, que vossas consciências sejam aquietadas e consoladas, e, finalmente, [que] a vida seja preservada em vossa alma, cuidem de exercitarem-se frequentemente na lei do Senhor, vosso Deus. Não tenhais em pouco estima os preceitos que Moisés deu aos israelitas com estas palavras: “E estas palavras, que hoje te ordeno, estarão no teu coração; e as ensinarás a teus filhos e delas falarás assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e deitando-te e levantando-te. Também as atarás por sinal na tua mão, e te serão por frontais entre os teus olhos. E as escreverás nos umbrais de tua casa, e nas tuas portas.”( Deuteronômio 6:6-9 – ACF). E Moisés, em outro lugar, ordenou-lhes para “lembrarem-se da lei do Senhor Deus, para cumpri-la, para que lhes vá fosse bem a eles e a seus filhos na terra a qual o Senhor vosso Deus lhes daria”. Dando a entender que, assim como frequentemente recordar e repetir os preceitos de Deus é o meio pelo qual o temor de Deus (que é o princípio da sabedoria e bem-aventurança), é mantido vivo na mente; assim também a negligência e o esquecimento dos benefícios recebidos de Deus é o primeiro passo para distanciar-se de Deus.

Agora, se a Lei, a qual, por causa de nossa fraqueza, não opera nada mais do que raiva e fúria, foi tão eficaz (que relembrada e repetida, para pratica-la) [que] trouxe ao povo uma bênção corporal, o que diremos que não trará o glorioso Evangelho de Cristo Jesus quando tratado com reverência? Paulo lhe chama de cheiro de vida para aqueles que receberam a vida, usando a semelhança de ervas aromáticas e unguentos preciosos, cuja natureza é que quanto mais estes são friccionadas exalam seu aroma mais agradável e prazeroso; assim também, amados irmãos, é o bendito Evangelho de Jesus, nosso Senhor. Porque quanto mais nos ocupamos dele, mais confortável e agradável é para aqueles que o escutam, leem-no, ou  se exercitam no mesmo. 

Não ignoro, que como os filhos de Israel se enfastiaram do maná, porque era o único que viam e comiam todos os dias, assim também agora há alguns que depois de ler algumas porções da Escritura, se voltam de todo aos escritores profanos ou escritos humanos. Porque a variedade de assuntos que estes contêm trazem com e para eles deleite diário. Por outro lado, dentro das Escrituras de Deus não há muito adorno humano em si, a repetição de uma coisa lhes é chata e cansativa. Confesso que essa tentação pode entrar até mesmo nos eleitos por um tempo, porém é impossível que continue até o fim. Porque os eleitos de Deus, além de outras características evidentes, possuem sempre esta unida com as demais, que os eleitos de Deus são chamados para fora da ignorância (falo dos que têm idade suficiente para compreender) para provar e sentir um pouco da misericórdia de Deus, da qual nunca estão satisfeitos nesta vida, mas que ocasionalmente têm fome e sede de comer o pão que desceu do céu e de beber a água que salta para a vida eterna. O que não podem fazer, senão pelo meio ou pelo instrumento da Fé, e a Fé sempre objetiva a vontade de Deus revelada pela Palavra, de maneira que a Fé tem tanto o seu início como sua continuação pela Palavra de Deus. E por isto eu digo, que é impossível que os filhos escolhidos por Deus possam depreciar ou rejeitar a Palavra de sua salvação por muito tempo, como tampouco podem enfastiar-se dela definitivamente.

É coisa comum que os eleitos de Deus são mantidos em tal escravidão e servidão, de modo que eles não podem conseguir que se lhes conceda o pão da vida, como tampouco têm a liberdade para exercitar-se na Palavra de Deus. Mas eles não se enfastiam, antes de bom grado anelam o alimento da sua alma, antes acusam sua negligência anterior, e lamentarem a aflição miserável de seus irmãos, e clamam e pedem em seus corações (e também em público, onde eles podem) para que corram livremente ao Evangelho. Esta fome e sede confirma que existe vida em suas almas. Mas se tais homens, que têm a liberdade de ler e exercitarem-se a si mesmo nas Escrituras, começam a fadigar-se porque quase sempre leem o mesmo, eu pergunto, por que não se cansam também de comer o pão de cada dia? Por que não se cansam de beber vinho todos os dias [não o tipo de bebidas alcoólicas de hoje]? Por que não se cansam de olhar diariamente a luz do sol? Por que não se cansam de usar as demais criaturas de Deus que mantêm diariamente sua própria substância, curso e natureza? Penso que responderam: “Porque tais criaturas têm um poder [quantas vezes são usadas para suprimir a fome e a sede e para infundir alento e forças e] para preservar a vida.” Oh, criaturas miseráveis! Quem se atreve a atribuir mais poder e força a criaturas corruptíveis para nutrir e preservar o corpo humano mortal, do que à Palavra eterna de Deus para nutrir a alma que é imortal! O querer arrazoar com sua ingratidão abominável não é o meu propósito agora. Porém a vós outros, amados Irmãos, quero compartilhar meu conhecimento e lhes abrir a minha consciência, que é tão necessário como é o uso de comida e da bebida para preservar a vida do corpo, e assim como necessário é o calor e a luz do sol para dar vida a erva e para dissipar as trevas, assim também é necessário para a vida eterna, e para a iluminação e  luz da alma, a meditação, exercício e uso perpétuo da Sagrada Palavra de Deus.

Portanto, queridos Irmãos, se anelais a vida vindoura, por necessidade devem exercitarem-se a si mesmos no Livro do Senhor, vosso Deus. Que não haja nenhum dia que não recebais algum consolo da boca de Deus. Abram seus ouvidos, e Ele falará coisas deleitosas ao vosso coração. Não fechem seus olhos, antes com diligência contempleis que porção substanciosa vos é deixada no Testamento de vosso Pai. Que suas línguas aprendam a louvar a Sua terna bondade, em cuja, somente por misericórdia, vos chamou das trevas para a luz, da morte para a vida. Tampouco façais isto tão privadamente que não admita testemunhas. Não, irmãos, o Senhor Deus vos ordena que vocês governem suas casas em verdadeiro temor, e de acordo com a Sua Palavra. Dentro de suas casas, digo, em alguns casos, sóis bispos e reis, sua esposa, filhos e família são o vosso bispado e encargo. Disto se vos pedirá conta de quanto cuidado e diligência usastes para instruí-los no verdadeiro conhecimento de Deus, de como procurastes implantar virtudes e reprimir vícios. Por tanto, digo, vocês devem faze-los participantes da leitura, da exortação e da oração comuns, a qual deveria acontecer em cada casa pelos menos uma vez por dia. Mas, acima de tudo, queridos irmãos, procurem praticar diariamente e viver como manda a Palavra de Deus, e então vocês comprovarão que nunca ouvireis ou lerei o mesmo sem que obtenhais algum fruto. Creio que isto é o suficiente para os exercícios dentro de vossa casa.

Considerando-se que Paulo chama a igreja de “o corpo de Cristo”, do qual cada um de nós é membro, e ensinando-nos com que nenhum membro pode sustentar-se e alimentar-se sem a ajuda e o apoio de outro, creio que é necessário que se tenham estudos e palestras sobre as Escrituras como reuniões entre irmãos. Como Paulo dá a ordem a ser observada para isto [1 Coríntios 14:26-29], somente quero salientar que, quando vos reunais, que seria bom fazê-lo uma vez por semana, que seu início fosse confessando seus pecados e implorando que o Espírito do Senhor os assista em todos os vossos projetos e objetivos espirituais. Depois que se leia alguma porção das Escrituras de forma clara e modesta, tanto quando se pense ser necessário para a ocasião ou tempo. Quando terminar, se algum irmão tem exortação, pergunta ou dúvida, que não tenha medo de falar ou trata-la ali mesmo, fazendo-o com moderação, seja para edificar [a outros] ou para edificar-se. E sem dúvida disto virá grande proveito. Porque, em primeiro lugar, o ouvir, ler e estudar as Escrituras nestas reuniões ajudarão a examinar o juízo e a atitude das pessoas, sua paciência e modéstia serão conhecidos e, finalmente, seus dons e expressões serão manifestos. Por outro lado, deve ser evitado em todas as ocasiões e em todos os lugares os falatórios vãos, as interpretações longas e aborrecidas e a teimosia sobre pontos controversos. Mas acima de tudo, quando se reunirem como igreja, ali nada deve ser considerado mais em conta do que a glória de Deus e o consolo e edificação dos irmãos.

Se algo brota do contexto em discussão ou debate que vosso juízo não pode resolver ou vossas faculdades não podem compreender, que seja observado e escrito antes do final da reunião, para que quando Deus proveja uma solução para o assunto, suas dúvidas que brotaram sejam resolvidas com mais facilidade. Por outro lado, se vocês tem a oportunidade de escrever ou se comunicar com outros, suas cartas manifestarão o vosso grande desejo por Deus e por Sua verdadeira religião. Não duvido que eles, segundo seus talentos se esforçarão e lhes concederão seu fiel trabalho para atender às suas solicitações devotas. Quanto a mim mesmo falo o que eu penso: empregaria quinze horas com muito bom gosto (segundo agrada a Deus iluminar-me) para lhes explicar alguma porção das Escrituras, do que meia hora em outra coisa.

Ademais, eu gostaria que, na leitura das Escrituras, tomem também alguns livros do Antigo Testamento e alguns do Novo, como Gênesis e um dos Evangelhos, Êxodo com outro livro, etc., porém sempre terminando [a leitura] dos livros que você começaram (segundo lhes permita o tempo). Pois lhes confortará o ouvir a harmonia e a concordância do Espírito Santo, falando através de nossos pais desde o princípio. Os confirmará nestes dias perigosos o contemplar a face de Jesus Cristo, o amado esposo, e sua igreja, desde de Abel até o próprio Cristo, e de Cristo até este dia, que há unidade e um mesmo propósito em todas as gerações. Estudem com frequência os profetas e as epístolas de Paulo. Pois a abundância de  assuntos mui consoladores que estão ali requerem exercício e uma boa memória. Semelhantemente, assim como as vossas reuniões devem começar com a confissão e súplica do Espírito de Deus, assim também deve acabar com ações de graças e orações pelos governantes e magistrados, pela liberdade do Evangelho de Cristo, que seja anunciado livremente, para o consolo e liberdade dos nossos irmãos que ainda estão sob tirania e servidão, por outras coisas que o Espírito do Senhor Jesus Cristo os ensine que vos é útil, seja para vós mesmos, ou para os seus irmãos, onde quer que estejam.

Se assim for (ou até melhor) ouço que vos exercitais a vós mesmos, queridos Irmãos, então louvarei a Deus por sua grande obediência, como também para aqueles que receberam a palavra de graça não somente com gozo, mas também com solicitude e diligência, e guardam a mesma como um tesouro e uma joia preciosa. E porque eu não tenho suspeitas de que fareis o contrário, não usarei de ameaças. Bem, a minha sincera esperança é que vocês andem em meio a esta geração perversa como filhos da luz, que sereis como estrelas à noite (que não são envolvidas pelas trevas), que sereis como o trigo entre o joio, e que sem embaraço não mudareis vossa natureza que recebestes pela graça, através da comunhão e participação que temos com o Senhor Jesus Cristo em Seu corpo e em Seu sangue. E, finalmente, que sereis do número das virgens prudentes, que diariamente granjeiam e enchem suas lâmpadas com azeite, enquanto aguardam pacientemente a aparição gloriosa e vinda do Senhor Jesus Cristo, cujo Espírito onipotente governe e instrua, ilumine e conforte suas mentes e corações em toda provação, agora e sempre. Amém.

A graça do Senhor Jesus Cristo seja convosco.

Lembrem-se de minhas fraquezas em suas orações. 


07 julho de 1556.

Vosso sincero irmão,


John Knox


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Traduzido por: William Teixeira
Revisão: Camila Rebeca Almeida
 

Via: O Estandarte de Cristo

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