Primeiramente temos de ver qual é a natureza da graça. Que características a graça possui? Valorizamos o amor de Deus, pois sem o amor de Deus como fonte não haveria o fluir da salvação. O fluir da salvação resulta do amor de Deus. Ao mesmo tempo, sem a misericórdia de Deus não haveria a possibilidade de salvação. Por ter Deus mostrado misericórdia para conosco, Ele nos deu a Sua salvação. A salvação de Deus é a expressão concreta do amor de Deus. Por isso valorizamos o amor e também valorizamos a misericórdia. Contudo, o que de mais precioso nos alcança é a graça. O amor sem dúvida é bom, mas ele não nos traz nenhum benefício concreto. A misericórdia é também muito boa, mas ela não nos traz qualquer benefício direto; no entanto, com a graça há um benefício direto. Portanto, a graça é mais preciosa. O Novo Testamento está repleto, não com o amor de Deus nem com a misericórdia de Deus, mas com a graça de Deus. Graça é o amor de Deus vindo para cumprir algo para o pecador caído, perdido e que perece. Agora não temos somente um amor abstrato e uma misericórdia sentimental, mas temos a graça que vem ao encontro das nossas necessidades de maneira concreta.
Podemos achar que já é bastante maravilhoso se Deus for misericordioso conosco. Um carnal ou uma pessoa que vive na carne pensará que misericórdia é suficiente. O Antigo Testamento está repleto de palavras de misericórdia. Não existem muitas palavras sobre graça. Quando o homem está na carne, ele acha que misericórdia basta, que não há necessidade de graça. Ele pensa assim por não considerar o pecado como algo grave. Se o homem estivesse sem comida, sem roupas ou sem casa, misericórdia não seria suficiente; haveria também a necessidade de graça. Mas o problema com o pecado não é falta de comida, de roupas ou de casa. O problema com o pecado é a inquietação na consciência do homem e o julgamento diante de Deus. Por essa razão, o homem acha que se tão-somente Deus fosse misericordioso conosco e um pouco mais brando, tudo estaria bem. Se Deus desconsiderasse nossos pecados já seria bastante bom para nós. Em nosso coração esperamos que Deus seja misericordioso conosco e nos deixe ir. O conceito do homem é deixar ir e desconsiderar. Mas Deus não pode misericordiosamente desconsiderar nossos pecados. Ele não pode deixar-nos ir de qualquer jeito. Ele precisa lidar totalmente com nossos pecados.
Deus não somente tem de mostrar misericórdia para conosco, como também tem de nos conceder graça. O que procede do amor de Deus é a graça. Deus não está satisfeito somente com a misericórdia. Pensamos que se houvesse a misericórdia e que se Deus nos deixasse ir e não ajustasse contas conosco, tudo estaria bem. Mas Deus não disse que desde que tenha pena de nós Ele nos deixaria ir. Essa não é a maneira de Deus trabalhar. Quando age, Ele faz em harmonia Consigo mesmo. Portanto, o amor de Deus não pode parar na misericórdia. Seu amor deve estender-se até a graça. Ele deve lidar completamente com o problema dos nossos pecados. Se o problema dos pecados fosse algo que pudesse ser desconsiderado, a misericórdia de Deus seria suficiente. Mas deixar-nos ir e desconsiderar nossos pecados não é suficiente para Ele. Assim, ter só a misericórdia não é suficiente. Ele deve pôr a questão de pecados completamente em ordem. Aqui vemos a graça de Deus. É por isso que o Novo Testamento, embora não isento de misericórdia, está cheio de graça. Ali vemos como o Filho de Deus, Jesus Cristo, veio ao mundo para manifestar a graça e tornar-se graça a fim de que pudéssemos receber graça.
Que é graça? Graça nada mais é que a grande obra de Deus realizada gratuitamente em Seu amor incondicional e ilimitado em favor do homem desamparado, indigno e pecador. A graça de Deus é simplesmente Deus trabalhando para o homem. Como isso se diferencia da lei? A lei é Deus exigindo que o homem trabalhe para Ele, enquanto a graça é Deus trabalhando para o homem. Que é a lei? A lei é a exigência de Deus para que o homem faça algo para Ele. Que é obra? Obra é o esforço do homem para fazer algo para Deus. Que é graça? Graça nem é Deus exigindo algo nem é Deus recebendo a obra do homem, mas graça é Deus fazendo a Sua própria obra. Quando Deus vem para fazer algo pelo homem e a favor do homem, isso é graça.
A ênfase no Novo Testamento não está no princípio da lei. Na verdade, o Novo Testamento opõe-se ao princípio da lei, pois a lei e a graça jamais podem misturar-se. É Deus quem está trabalhando ou é o homem? Deus está dando algo para o homem ou está pedindo algo do homem? Se Deus estiver pedindo algo do homem, nós ainda estamos na era da lei. Contudo, se Deus estiver dando algo para o homem, estamos na era da graça. Você não iria à casa de alguém dar-lhe dinheiro se houvesse ido lá para pedir dinheiro. Semelhantemente, lei e graça são princípios opostos; elas não podem ser colocadas juntas. Se é para o homem receber graça, ele deve colocar a lei de lado. Por outro lado, se ele seguir a lei, cairá da graça.
Se é para o homem seguir a lei, ele deve ter suas obras aceitas por Deus. Se há o princípio da lei e das obras e se o homem deve dar algo a Deus, ele deve dar-Lhe aquilo que Ele exige. A Bíblia indica que as obras do homem deveriam ser uma resposta à lei de Deus. A lei de Deus requer que se faça algo. Ao fazê-lo, estou respondendo à lei de Deus. Isso é o que a Bíblia chama de obras. Mas quando a graça vem, o princípio da lei e das obras é posto de lado. Aqui vemos que é Deus trabalhando pelo homem em vez de o homem trabalhar para Deus.
Graça, que é Deus trabalhando pelo homem desamparado, infeliz e aflito, tem três características ou naturezas. Quem quiser entender a graça de Deus deve lembrar-se dessas três características ou naturezas. Se nos esquecermos delas, como pecadores não seremos salvos, e como cristãos fracassaremos e cairemos. Se virmos as características e a natureza da graça de Deus, receberemos mais graça de Deus para socorro em ocasião oportuna. Vamos considerar brevemente essas três características na Bíblia.
Quais são as obras do homem? Genericamente falando, existem três coisas consideradas como obras do homem: 1) seus delitos, 2) suas realizações e 3) suas responsabilidades. As obras más do homem são seus delitos; as boas são suas realizações e as obras que ele está disposto a assumir suas responsabilidades. Aqui temos três coisas: das coisas que o homem faz, as que não são bem feitas tornam-se seus delitos; as que são bem feitas tornam-se suas realizações, e as que ele promete fazer para Deus são suas responsabilidades. Na questão do tempo, delitos e realizações são coisas do passado, enquanto responsabilidades são coisas do futuro; são coisas pelas quais um homem é responsável. Se a graça de Deus é Deus trabalhando pelo homem pecaminoso, fraco, ímpio e desamparado, imediatamente vemos que a graça de Deus e o delito do homem não podem ser unidos. Tampouco pode a graça de Deus ser unida às realizações e responsabilidades do homem. Quando a questão do delito entra em cena, a graça não existe. Quando a questão da realização entra em cena, a graça também não existe. De semelhante modo, onde houver a responsabilidade, a graça não existirá. Se a graça de Deus é de fato graça, os delitos, as realizações e as responsabilidades não podem ser misturados a ela. Sempre que os delitos, as realizações e as responsabilidades são adicionados, a graça de Deus perde suas características.
A Graça de Deus não está Relacionada com os Delitos do Homem
A primeira característica da graça de Deus é que ela não está relacionada com os maus procedimentos do homem. A graça de Deus é concedida ao homem pecaminoso, aos pecadores desamparados, baixos, fracos e impiedosos. Se a questão do delito surge e se está determinado que aqueles com pecado não terão graça, então a graça está fundamentalmente anulada. A graça de Deus nunca pode ser retida simplesmente porque o homem pecou. A graça de Deus não pode ser reduzida nem quando os pecados do homem aumentam. Isso nunca pode ocorrer.
A mente do homem, estando cheia da carne, está preenchida com o conceito da lei. Podemos achar que os bem-sucedidos podem receber graça, mas nós, pecadores e sem realizações, estamos desqualificados para receber graça. No conceito do homem, delito e graça estão em extremos opostos. No conceito do homem, graça somente vem onde não houver delito. Se você disser a alguém que tem alguma consideração por Deus, que Deus o amou e deu-lhe graça, ele imediatamente vai querer saber como isso pode ser verdade, uma vez que ele tem cometido tantos pecados. O conceito do homem é que a graça pode ser recebida somente quando não há delito. Ele não consegue perceber que isso está totalmente errado. Por quê? Porque o delito dá a melhor oportunidade para a graça operar. Sem delito, a graça não tem oportunidade de manifestar-se. Além de ser incapaz de impedir a graça, o delito é a condição necessária para a graça ser manifestada.
Da mesma forma, nossa insuficiência diante do Senhor não é um impedimento para a graça. Pelo contrário, a nossa pobreza é uma condição para recebermos graça. Se não estivermos muito pobres, não estaremos desejosos de receber graça. Todo domingo de manhã há oito ou nove mendigos em nosso local de reuniões. Eles vêm todos os domingos, e são muito pontuais. Quando se aproximam e você lhes dá uma ou duas moedas, eles sorriem e pegam-nas. Mas, que ocorreria se você oferecesse uma moeda a qualquer irmão ou irmã entre nós que estivesse bem vestido e que tivesse uma boa educação, e dissesse: “Tome aqui, pegue isto. Arranje mais duas moedas e poderá comprar um salgadinho na rua”? Certamente ele ou ela não aceitariam; e não somente não aceitariam, mas considerariam isso um insulto. Portanto, ser pobre é uma condição para receber graça; de fato, é a condição mais necessária.
O homem é muito ilógico. Ele diz que não pode receber graça porque seus pecados são numerosos demais. Nenhuma afirmação é mais contraditória que essa; nenhuma afirmação é tão insensata. Porque os doentes estão doentes é que precisam de um médico; porque os pobres são pobres é que precisam de ajuda; e da mesma forma, porque o homem é um pecador é que ele precisa de graça. Portanto, o pecado não é um empecilho. Pelo contrário, é uma oportunidade. Nosso problema é que sempre achamos que temos de estar numa condição diferente da que estamos hoje. Achamos que para receber graça devemos ser mais santos e melhores hoje do que ontem.
Amigos, quem quiser ser um magistrado, terá de satisfazer certas exigências. Se quiser entrar numa escola, haverá os pré-requisitos. Se quiser ser um médico num hospital, haverá a questão da capacitação. Se quiser fazer negócios, existe a questão da habilidade. Qualificações, pré-requisitos, capacitação e habilidade são de fato úteis em determinadas situações. Contudo, se o homem deseja vir a Deus, qualificações, padrões, capacidade e habilidade estão fora de questão. Somente quando eu for um pecador desamparado, na mais baixa posição, poderei receber graça. O homem deixa de obter graça não por ser pecaminoso demais, mas por não estar em condição suficientemente baixa. Ele é orgulhoso demais e moral demais. É exatamente aqui que se encontra o maior problema. Somos grandes em todos os tipos de pecados. Ao mesmo tempo, somos muito grandes no pecado do orgulho. Por um lado, temos uma necessidade absoluta; por outro, o terreno em que nos encontramos não é aquele no qual podemos receber a graça de que necessitamos. Isso ocorre exclusivamente por causa do nosso orgulho.
Romanos 5:20 diz-nos que “onde abundou o pecado, superabundou a graça”. A Palavra de Deus mostra-nos que onde estiver o pecado, ali estará também a graça. Onde o pecado abundar — não que ele tenha realmente abundado, pois todos os homens pecam semelhantemente, mas onde o pecado tenha-se manifestado mais abundantemente — a graça de Deus abunda ainda mais. A palavra abundar na linguagem original tem a ver com a idéia de transbordar. Não sei se você já esteve à beira-mar ou à margem de um rio. Quando a maré alta vem, uma marca é deixada na praia ou margem. Mas se vier uma enchente esta ultrapassa a marca. Quando a água alcança a marca, dizemos que há somente uma elevação normal da maré, mas se a água sobe acima da marca há uma enchente. Isso é o que significa abundar. O pecado é tão grande, mas a graça é maior e até mesmo cobre o pecado. Aleluia! O pecado é grande, mas a graça é ainda maior e cobre o pecado. Esta é a graça de Deus. O homem tem o estranho conceito de que para receber graça, deve estar sem pecado ou delito. Mas isso não existe. Embora nossos delitos sejam muito sérios e possam elevar-se muito, a graça de Deus se eleva ainda mais. Uma vez que a graça de Deus está aqui para lidar com o problema dos delitos, os delitos não são mais um problema.
Qual é a essência da graça de Deus? A graça de Deus é simplesmente Deus vindo à posição do pecador para tomar sobre Si a conseqüência dos pecados do pecador. Por favor, lembre-se da definição que demos antes, que graça é Deus trabalhando em favor do homem. Se não tivermos qualquer delito, não necessitamos de que Deus faça qualquer coisa por nós e, como resultado, não necessitamos da graça de Deus. Mas por termos pecado e por termos problemas, Ele tem de vir e solucionar nossos problemas. Portanto, necessitamos da graça. Se eu digo: “Uma vez que pequei, não posso receber graça” é como dizer: “Por estar doente demais, estou muito envergonhado para ver o médico. Eu o verei quando minha temperatura tiver abaixado um pouco”. Visto que não há tal paciente no mundo, tampouco deve haver tal pecador no mundo. Assim sendo, nossos delitos são a condição para recebermos a graça de Deus.
Uma vez que o problema do pecado é cuidado por Deus e já que Ele toma a responsabilidade de lidar com nossos delitos, qualquer pecado que tenhamos, seja grande ou pequeno, não constitui problema diante de Deus. Tanto os pecados grandes como os pequenos não apresentam problema, pois ambos podem ser solucionados pela obra de Deus e somente pela obra de Deus. O pecado grande é cuidado pela obra de Deus. O pecado pequeno da mesma forma requer a obra de Deus. Se coubesse a nós lidar com nossos pecados, distinguiríamos entre pecados grandes e pecados pequenos. Contudo, se nossos pecados devem ser cuidados por Deus, serão cuidados não importando se são grandes ou pequenos. Uma vez que devam ser cuidados por Deus, não faz diferença alguma para nós. Tudo o que fazemos é receber a graça.
Vimos anteriormente por que o homem não pode receber graça. Lembre-se das palavras de Pedro em 1 Pedro 5:5: “Rogo igualmente aos jovens: sede submissos aos que são mais velhos; outrossim, no trato de uns com os outros, cingi-vos todos de humildade, porque Deus resiste aos soberbos, contudo, aos humildes concede a sua graça”. Deus dá graça ao humilde. Se você humildemente confessa que é um pecador, seus delitos não só não o impedirão de receber a graça de Deus, mas permitirão que você receba Sua graça. Uma vez que se humilhe diante de Deus, a graça de Deus fluirá para você. Agradecemos a Deus que a Sua graça desce para nós; ela não é bombeada até nós. Ninguém jamais pode bombear a graça de Deus para si mesmo. Portanto, todos os que estão no alto devem descer.
Quem são os pecadores e quem pode receber graça? A Bíblia mostra-nos claramente em Romanos 3:23-24 que “todos pecaram”, mas todos os que pecaram são “justificados gratuitamente, por sua graça”. A Bíblia mostra-nos que desde que o homem peque, espontaneamente pode receber graça. Sem ser pecador, ele não pode receber graça. O homem pensa que quem pecar não pode receber graça. Contudo, Deus diz que porque o homem peca, ele pode receber graça. É tão óbvio: uma vez que o homem tenha pecado a graça vem. Nunca pense que quando o pecado vem, a graça se vai. O pecado é um dos maiores enganos do homem, mas achar que o pecado o impede de receber graça é o maior engano do homem.
Portanto, a primeira coisa que devemos ver é que os delitos do homem não podem permanecer no caminho da graça de Deus. Com a graça de Deus, não existe problema por causa dos delitos. Pelo contrário, a graça de Deus está ali para lidar com os delitos do homem. Deus está concedendo graça porque o homem pecou.
A Graça não está Relacionada com as Realizações do Homem
Agora surge a segunda questão. Nem tudo o que o homem faz é pecado. Aos olhos de Deus, todos os atos do homem são pecados, mas aos olhos do homem, muitas coisas que ele faz são realizações. Alguns consideram que já que são muito pecadores não podem receber graça. Outros acham que porque pecam, têm de aperfeiçoar-se antes que possam receber graça. Note, por favor, que existe uma diferença aqui. O primeiro grupo diz que eles pecaram e são, portanto, desqualificados para receber graça. Este grupo está totalmente na esfera negativa. O segundo grupo é um pouco mais positivo: eles dizem que são pecadores e que somente receberão graça se agirem melhor. Acham que têm de alcançar certo padrão de conduta e certas realizações antes que possam receber graça. Na mente do primeiro grupo, o problema é um obstáculo para a graça. Na mente do segundo grupo, o problema é como obter graça. Alguns acham que os delitos nos impedirão de receber a graça de Deus. Outros acham que as realizações nos capacitarão a obter a graça de Deus.
Amigo, você sabe o que é graça? A graça é incondicional. Ela é gratuita e não há motivos para que seja dada. É a obra de amor de Deus que Ele confere a nós, os pecadores. Se a graça de Deus estivesse relacionada com as realizações do homem, a essência da graça se perderia imediatamente. Uma vez que seja permitido permanecer em nós um vestígio de realização, Deus deve recompensar-nos de acordo com nossa realização. Deus é justo. E desde que Ele é justo, no mínimo Ele é correto. Ele tem de recompensar e premiar o homem de acordo com suas realizações. Mas se o dar de Deus é uma recompensa ou prêmio, então não é graça. Tão logo as realizações entrem, a recompensa também deve entrar e a graça fica do lado de fora. Se um homem lhe dá um mês de trabalho e você lhe dá o salário de um mês, o pagamento não pode ser considerado um presente; é uma recompensa. Ele fez algo para você; é a realização dele. E se é uma realização o pagamento não é graça, mas recompensa. Desde que a recompensa entre, a graça sai.
Romanos 4:4 torna a questão muito clara: “Ora, ao que trabalha, o salário não é considerado como favor, e sim como dívida”. Os delitos não nos impedem de receber graça, pelo contrário, proporcionam-nos a oportunidade de receber a graça de Deus. E as realizações não nos ajudam a receber a graça de Deus, pelo contrário, anulam a essência da graça de Deus. A não ser que seja gratuita, não é graça. A não ser que seja dada sem razão e causa e a não ser que seja um presente, não é graça. Se há alguma razão ou alguma causa envolvida, se há um preço envolvido ou se há algum labor envolvido, imediatamente surge a questão da recompensa, porque Deus é justo. No instante em que a recompensa entra, a essência da graça é perdida.
Se estiver numa posição acima de Deus ou mesmo igual a Deus, você não pode receber graça. É por isso que Romanos 4 diz claramente que ninguém pode vir diante de Deus e dizer que fez isso ou aquilo e que, portanto, sem se envergonhar, pode pedir graça. Se uma pessoa diz que não é como as outras que roubam dinheiro e são tão injustas, que jejua pelo menos duas vezes na semana, que embora não tenha dado o dízimo, pelo menos ofertou um vigésimo do que tem, ela não pode receber a graça de Deus. Que é graça? Deixe-me dizer isto de um modo enfático — graça é receber sem ter um motivo para receber. Uma vez que haja um motivo, ela se torna recompensa. Se você tem quaisquer realizações, a questão da recompensa entra e a graça fica de fora. Devemos dar muita atenção a essa questão.
Há ainda outra frase em Romanos que é muito clara sobre esse ponto: “E, se é pela graça, já não é pelas obras; do contrário, a graça já não é graça” (11:6). Alguém na minha família certa vez disse que deveríamos dar um presente a determinado médico no fim do ano. Quando perguntei por quê, foi-me dito que dois meses antes meus dois irmãos mais novos tinham ficado doentes e foram tratados por aquele médico. Por ser um amigo, o médico não quis aceitar qualquer dinheiro pelos seus serviços. Portanto, compraríamos algo para ele. “Neste caso”, disse eu, “não lhe estamos dando algo, mas devolvendo algo”. Por quê? Porque houve um trabalho e uma dívida. Portanto, rigorosamente falando, o nosso dar foi uma devolução do que devíamos.
Meus amigos, se tivéssemos quaisquer realizações diante de Deus, fossem elas grandes ou pequenas, a salvação de Deus para nós tornar-se-ia um pagamento de dívida e não seria mais graça. Agradecemos a Deus porque não há ninguém que possa clamar por qualquer realização diante de Deus. Agradecemos ao Senhor porque somos salvos pela graça. Se eu, Watchman Nee, fosse salvo pelas minhas realizações, nunca poderia dizer: “Deus, agradeço-Te por conceder-me graça”. Ao contrário, eu diria: “Deus, estou salvo porque pagaste a Tua dívida”. Poderia proclamar orgulhosamente que estou salvo pelas realizações. Por que ninguém pode salvar-se pelas realizações? Porque Deus quer remover todo orgulho do homem, para que o homem nada possa fazer senão agradecer e louvá-Lo. Já que a questão das realizações surge, a graça não é mais graça.
Por favor, lembre-se de que Deus não pode deixar de dar a Sua graça ao homem por causa de seus delitos. Tampouco pode reduzir Sua graça para o homem por causa de seus delitos. Deus tem de dar e Ele não pode reduzir o Seu dar. A graça não está relacionada com os delitos. E que dizer sobre as realizações? Na graça não existe a possibilidade de mistura com o que quer que seja, nem mesmo com a essência das realizações. Graça não é o pagamento de Deus a uma dívida que tem para conosco. Não é que Deus nos deve e que agora Ele está pagando. Alguns podem dizer: “Senhor Nee, nós não somos tão extremistas. Não ousamos dizer que viemos a Deus pelas nossas realizações. Mas o senhor tem de acreditar que precisamos de algumas realizações diante de Deus. É impossível não ter nada. Devemos fazer uma pequena obra e, então, Deus pode suprir nossa falta. Faremos o melhor possível e Deus suprirá o restante”. Meus amigos, não podemos dizer isso. Graça não é Deus pagando uma dívida. Da mesma forma, graça também não é o pagamento excessivo de uma dívida de Deus, como se Deus devesse a você cinco dólares, mas agora está lhe devolvendo dez. Graça é como se alguém lhe desse uma roupa nova. Não é como se alguém remendasse sua roupa rasgada. Se graça fosse um remendar, ela perderia sua posição e sua essência seria anulada.
Deixe-me repetir novamente, graça nada tem a ver com realizações. O que o homem naturalmente vê é que algumas pessoas são melhores e outras, piores. Portanto, ele acha que os melhores requerem menos da graça de Deus e os piores requerem mais da graça de Deus — um remendo maior para um buraco maior e um remendo menor para um buraco menor. Todavia esse conceito não existe na Bíblia.
Quem pecou? Creio que todos conhecemos a frase de cor: “Pois todos pecaram”. Por que é que todos pecaram? Porque “carecem da glória de Deus” (Rm 3:23). Se a Bíblia dissesse que todos pecaram por terem transgredido os Dez Mandamentos, poderia haver uma diferença entre grandes pecadores e pequenos pecadores, pois alguns podem ter transgredido nove mandamentos, enquanto outros podem ter transgredido somente um. Se a Bíblia dissesse que todos pecaram porque todos carecem dos costumes da sociedade ou da lei do país, ainda haveria alguns que são bons e alguns que não são tão bons. Mas muito estranhamente a Bíblia diz que todos pecaram, porque todos carecem da glória de Deus. Que é, então, a glória de Deus? Se quer entender o que é a glória de Deus, você tem de entender Romanos 1 a 8. A graça de Deus está ligada à glória de Deus. A graça procura o homem no nível mais baixo e a glória leva o homem ao nível mais elevado. Romanos 1 a 3 diz-nos como o homem pecou. A seguir, após dar o caminho da salvação pelo Senhor Jesus nos capítulos três a cinco, a crucificação com Cristo nos capítulos seis e sete, e a obra do Espírito Santo no início do capítulo oito, Romanos diz-nos o seguinte no final do capítulo oito: “Aos que de antemão conheceu, também os predestinou (...) e aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou” (vs. 29-30). Salvação é Deus puxando um pecador da lama do pecado e levando-o até a glória. Embora estejamos justificados, sabemos que justificação não é suficiente. A justificação não é o alvo da salvação de Deus para nós. Deus não vai parar até que estejamos na glória. Portanto, Romanos 1 a 8 começa com pecados e termina com glória.
Que significa carecer da glória de Deus? Significa não poder entrar na glória. Todos pecaram porque não podem entrar na glória. Se todos pecaram porque não honraram seus pais, você poderia encontrar desonradores “grandes, médios e pequenos”. Talvez para quatrocentos milhões de chineses existam quatrocentos milhões de tipos de desonradores. Contudo, quanto ao carecer da glória de Deus, isto é, quanto a não poder entrar na glória, você e eu somos exatamente iguais. Você pode ser moralista, e eu, criminoso. Como criminoso eu não posso entrar na glória, tampouco você o pode como moralista. Portanto, diante de Deus todos carecem de Sua glória, e ninguém está qualificado para entrar nela.
Você pode sair à rua e dizer a qualquer pessoa que ela pecou. Se ela disser que não pecou, você pode perguntar-lhe se ela acha que pode entrar na glória. É óbvio que a pessoa não saberá o que é glória. Se estivermos na luz de Deus e se tivermos um pouco de conhecimento das Escrituras, saberemos que não estamos qualificados a entrar nela. Nenhum de nós pode entrar nela.
Dois meses atrás, enquanto eu estava em Hong Kong, acontecia ali o campeonato mundial de tênis. O estádio onde ocorria a competição só podia acolher de quinhentos a seiscentos espectadores. Oitocentas pessoas não puderam entrar e tiveram de ficar do lado de fora. O problema não era se eles tinham dinheiro ou não, se eram homens ou mulheres, ou se eram senhores ou servos. Nenhum deles podia entrar. Se fosse rico ou pobre, educado ou ignorante, homem ou mulher, não fazia diferença. A diferença entre eles e os que entraram não estava no fato de serem ricos ou pobres, homens ou mulheres, educados ou ignorantes. O problema era que eles não podiam entrar.
Da mesma forma, a questão hoje não é se você é moral ou não, ou se é educado ou não. A questão agora é se você pode ou não entrar na glória. Todos os que não podem entrar na glória são pecadores e estão desqualificados diante de Deus. Portanto, Deus nivelou todos diante Dele. Temos um lote de terra em Jenru. Recentemente tivemos de gramá-lo. Para fazer isso tive de contratar alguns trabalhadores para nivelar o terreno. A questão hoje é se você pode ou não entrar. A despeito de ser moral ou não, você não pode entrar na glória. Deus nivelou todos. Por que Deus nivelou todos? Gálatas 3:22 diz-nos que “a Escritura encerrou tudo sob o pecado, para que, mediante a fé em Jesus Cristo, fosse a promessa concedida aos que crêem”. Deus encerrou a todos sob o pecado. Todos se tornaram pecadores, para que todo o que crê em Jesus Cristo receba a graça de Deus. Deus nivelou todos de maneira que Ele possa conceder graça a cada um.
Romanos 11:32 diz: “Porque Deus a todos encerrou na desobediência, a fim de usar de misericórdia para com todos”. Deus encerrou a todos na desobediência. Ele nivelou todos. Com que propósito? Com o propósito de poder mostrar misericórdia a todos. Assim sendo, diante de Deus, as realizações não podem ter nenhum lugar. Todos estão sobre o mesmo terreno.
Romanos 3:9 diz: “Que se conclui? Temos nós qualquer vantagem? Não, de forma nenhuma; pois já temos demonstrado que todos, tanto judeus como gregos, estão debaixo do pecado”. O veredito de Deus é que tanto os judeus como os gentios estão todos debaixo do pecado. Não há nenhuma oportunidade para que as realizações tenham lugar. Nas porções das Escrituras que acabamos de ler vemos que todos foram encerrados no pecado e na desobediência para que possamos ir a Deus a fim de receber graça e misericórdia. Que é a graça de Deus? Graça de Deus é Ele dar ao homem não de acordo com o que o homem merece. A graça de Deus não concede ao homem mais do que ele merece ou algo melhor do que ele merece. Graça é simplesmente Deus dar ao homem o que ele não deveria ter e não merece.
A Graça de Deus não está Relacionada com as Responsabilidades do Homem
Agora chegamos à terceira questão: as responsabilidades do homem. A graça de Deus nunca pode estar vinculada às responsabilidades do homem. Quais são as responsabilidades do homem? Por exemplo, suponha que eu dê a um irmão dez mil dólares para enviar a determinado lugar, mas por temer que ele perca o dinheiro, eu o encarrego dizendo: “Você é responsável por este dinheiro”. Que quero dizer? Quero dizer que se ele perder o dinheiro, terá de devolvê-lo. Este é o significado de responsabilidade. Delitos são questões do passado. Realizações também são questões do passado. Porém, responsabilidades são questões do futuro. Se Deus vai dar-nos graça, ela não pode estar ligada à responsabilidade. Quando peço a um irmão para levar dez mil dólares ao banco, aquele dinheiro não é dele, assim eu lhe digo que ele é responsável pelo dinheiro. Contudo, se esse dinheiro é um presente gratuito para ele, será que posso dizer: “Você é responsável por ele”? Certamente não. Uma vez que tenha dado o dinheiro a ele, o dinheiro é dele. O que ele fizer com o dinheiro é problema dele, mesmo que o atire num rio ou numa lata de lixo.
Alguns dizem que antes da salvação não tínhamos boas obras e éramos incapazes de salvar a nós mesmos. Não havia outra maneira de ser salvo exceto ter a graça de Deus salvando-nos. Mas agora que estamos salvos, eles dizem que deveríamos fazer boas obras, pois se não as fizermos estaremos novamente condenados a perecer. Muitos têm o conceito de que a salvação é proveniente da graça, mas manter esta salvação é proveniente do nosso mérito e labor. A isso é que chamo de responsabilidade. Muitos acham que se nos conduzirmos adequadamente após sermos salvos, nossa salvação será preservada, e se não nos conduzirmos adequadamente, Deus tomará de volta Sua salvação. Se a salvação pode ser tomada de volta, ainda é graça? Se é graça, não existe a questão de mérito passado, obra presente ou responsabilidade futura. Se introduzirmos a responsabilidade futura, então novamente não é mais graça.
Certa vez um pregador veio dizer-me que não cria que uma vez que uma pessoa fosse salva, ela estava salva para sempre. Eu perguntei-lhe por que pensava assim. Ele disse que acreditava que o homem é salvo pela graça, mas se o homem não se portar adequadamente após a salvação, perecerá. “Então isso é graça?” perguntei. A seguir dei-lhe uma ilustração. “Suponha que vamos a uma livraria juntos e cada um de nós escolhe o mesmo livro para comprar. Quando você pergunta ao vendedor o preço, ele lhe diz que custa sessenta centavos de dólar. Você lhe paga sessenta centavos e leva o livro para casa. Mas ao vasculhar meus bolsos, percebo que não tenho nenhum dinheiro. Eu também quero o mesmo livro, então digo ao vendedor que não trouxe nenhum dinheiro comigo, e pergunto se posso levar o livro agora e mandar o dinheiro mais tarde. Ele diz que posso fazê-lo porque nos conhecemos bem. Assim, eu também levo o mesmo livro para casa. Você pagou em dinheiro, mas eu adiei o pagamento. Deixe-me perguntar-lhe: A transação em dinheiro foi graça? Certamente não, pois o livro foi pago com sessenta centavos”. Ser salvo por meio de boas obras é como uma transação a dinheiro. Se tiver realizado boas obras, você pode ir a Deus e Ele dirá: “Bom, você pode ser salvo”. Se um homem é salvo dessa maneira, sua salvação não é por meio da graça. Agradeçamos ao Senhor porque ninguém é salvo dessa maneira. Que dizer sobre meu caso de adiar o pagamento? É como Deus antecipando a salvação ao homem. Se o homem não fizesse o bem após a salvação, seria requerido que ele a devolvesse. Ele teria de fazer o bem a fim de manter a sua salvação. Todavia isso tampouco é graça. Graça não é uma transação à vista nem é como um pagamento a prazo. Numa transação à vista, a pessoa paga agora; no pagamento a prazo, a pessoa paga depois. Mas ambos têm de pagar. Contudo, não adquirimos nossa salvação a crédito. Eu disse ao pregador que se a salvação é proveniente da graça, não há necessidade de boas obras. Então ele perguntou: “Isso quer dizer que não precisamos de boas obras nunca mais?” Eu disse: “Não, os cristãos precisam fazer boas obras. Mas as boas obras a que me refiro nada têm a ver com salvação. As boas obras a que me refiro têm a ver com o reino, com a recompensa e a coroa. A salvação não é comprada nem adquirida a crédito. A salvação é dada gratuitamente”.
Que significa dar gratuitamente? O Senhor Jesus disse: “Eu lhes dou a vida eterna” (Jo 10:28). A vida eterna é-nos dada por Deus. Certa vez fui comprar algo na loja de um amigo. Ele e eu nos conhecíamos muito bem, por isso ele não queria me cobrar. Ele disse-me que daria o artigo que eu quisesse. Não consegui convencê-lo a pegar o dinheiro, contudo ele insistia que eu levasse o artigo. Da mesma forma, Deus diz que nos dará vida eterna. Ele não disse isso apenas para voltar e mudar de idéia. Ele não disse que ela seria nossa se fizéssemos o bem e que Ele a tomaria de volta se não fizéssemos o bem. Não quero dizer que os cristãos não devam ter boas obras. Odeio o viver relaxado, mas isso nada tem a ver com minha salvação. Aleluia! A salvação nos é dada; ela não é comprada por nós. Entretanto, não devemos desprezar as boas obras. As boas obras estão relacionadas com a recompensa do reino, a coroa ou punição, mas elas nada têm a ver com a salvação. Se a salvação é de graça, a questão do futuro não é levada em conta.
Romanos 6:23 diz: “Porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus nosso Senhor”. Que é um dom gratuito? Um dom gratuito é um presente. Eu não posso enviar um presente para sua casa e, então, mais tarde enviar-lhe a conta. Se é um presente, é absolutamente grátis, e isso não pode ser mudado.
Portanto, a graça não está relacionada com seus delitos passados, suas realizações atuais ou sua responsabilidade futura. Se estiver relacionada com sua responsabilidade futura não é graça, pelo contrário, é uma compra a prazo. Agradecemos a Deus porque a vida eterna não é uma compra a prazo. É um presente. Agradecemos ao Senhor que a vida eterna é o dom de Deus em Seu Filho Jesus Cristo.
Uma vez que a salvação nos é dada por Deus, devemos lembrar-nos de uma coisa depois que fomos salvos: a salvação é obtida unicamente por meio de crer e é preservada sem levar em conta nossa fidelidade. Portanto, a condição para preservar nossa salvação é a mesma para obtê-la. Desde que ela é obtida gratuitamente, é também preservada gratuitamente. Agradecemos a Deus que por ser gratuita a obtenção da salvação, da mesma forma é eternamente gratuita a preservação dela.
Ao final do livro de Apocalipse, depois de o novo céu, a nova terra, o reino, o lago de fogo, o fim de Satanás e o grande trono branco terem sido todos mencionados, a Bíblia diz: “Quem quiser receba de graça a água da vida” (22:17b). Agradecemos ao Senhor porque Ele colocou, de propósito, o beber gratuito da água da vida no final do capítulo 22. Após termos visto o lago de fogo, a segunda morte, o fim de Satanás, o reino, o novo céu e a nova terra, podemos sentir temor de que Deus endureça Seu coração novamente; mas depois de todas essas coisas, Deus propositadamente declarou que a água da vida é gratuita. Não há preço para ela. Agradecemos ao Senhor porque temos a graça por meio de Jesus Cristo, e essa graça é gratuita. Ela não está relacionada com a nossa responsabilidade.
Muitas vezes tenho ouvido dizer que temos de fazer o bem e retribuir a graça de Deus. Essas palavras são comuns hoje na igreja. Mas tenho de perguntar onde na Bíblia há um versículo que diz que temos de retribuir a graça de Deus? Essa palavra é por demais contraditória. Se há retribuição, não há graça. E, se há graça, não há necessidade de retribuição. Agradecemos ao Senhor que em todo o Novo Testamento nunca nos é dito para retribuir alguma coisa. É verdade que nós, cristãos, devemos ter boas obras. Mas por que devemos ter boas obras? Por que temos de sofrer pelo Senhor? Por que temos de suportar a vergonha? Por que servimos ao Senhor? Como o Senhor tem tratado conosco em amor, assim também tratamos com o Senhor em amor; contudo não existe aqui o pensamento de troca. Não é que Deus me dá muito e eu em troca devolvo muito. Por Ele ter-me amado, não posso fazer nada exceto amá-Lo; porque Ele me amou, Ele foi crucificado por mim; e por amá-Lo, de boa vontade suporto a cruz por Ele. O que Ele me tem dado, tem sido dado gratuitamente, e o que estou dando a Ele também é dado gratuitamente. A dificuldade reside na mente legalista do homem. Em todas as coisas o homem pensa em negócios e na lei. Mesmo a questão da salvação é vista do ângulo de negócio. Hoje, se trabalhamos, servimos ao Senhor, sofremos vergonha ou carregamos a cruz, não é porque queremos recompensar a Sua graça — é porque O amamos. O amor com que Ele nos amou nos cativou, capturou nosso coração e constrangeu-nos a servi-Lo.
Se você fala em retribuir, é ignorante quanto ao valor da graça que recebeu. Se hoje toma emprestado dez dólares de um amigo, você vai querer pagar-lhe. Se tomar emprestado cem dólares, você também vai querer pagá-los. Se tomar emprestado mil dólares, ou mesmo dez mil dólares, você ainda deve querer pagar-lhe. Mas se tomar um milhão de dólares emprestado, você pode não ter o pensamento de pagar. E se tomar dez ou cem milhões de dólares emprestados, você não consegue imaginar o fato de pagar-lhe. Se tomar emprestado um trilhão de dólares, você nem mesmo sabe mais como pensar sobre pagar, pois a devolução tornou-se impossível. Se hoje você está querendo pagar a Deus, isso simplesmente significa que não conhece o quanto Deus lhe deu. Você não conhece a profundidade, o comprimento, a altura e a largura da graça de Deus para você. Se percebesse somente um pouco, você se aquietaria e desistiria da idéia de devolução. Você deveria fazer um voto ao Senhor voluntariamente, dizendo: “Sou um devedor voluntário para sempre”. A graça que Ele nos deu é grande demais. Mesmo se quisermos retribuir, não existe a possibilidade de fazê-lo.
Meus amigos, se devessem a alguém cem milhões de dólares, vocês teriam a audácia de comprar um bolinho de dez centavos e dar-lhe como “prova de agradecimento”? Será que isso poderia ser considerado um brinde? Nosso Deus tem feito tanto por nós. Ousaríamos dizer que Lhe estamos dando “um pequeno brinde” como retribuição? Não! Somente podemos dizer que Deus nos tem dado gratuitamente muito. Estou feliz por ser um eterno devedor. Deus tem-nos amado com amor eterno. Não há limite de comprimento, largura, altura e profundidade de Seu amor para conosco. Será que vamos retribuir a Deus com um “bolinho de dez centavos”? Só podemos dizer que voluntariamente aceitamos Seu amor. Odeio ouvir os homens falarem sobre retribuição! Odeio o conceito da lei! Somente desejo que os filhos de Deus vejam que assim como Deus é graça para nós, assim sejamos nós graça para Ele. Assim como Deus tratou generosamente conosco, também vamos tratar com Deus generosamente.
Aleluia! Não há a questão de delitos, realizações ou responsabilidades. A salvação nada mais é que Deus por mim, não eu por Deus. Graça é o que Deus tem feito por mim. Não é o que eu tenho feito por Deus. Por favor, lembrem-se de que a paz e a alegria de um pecador e a paz e a alegria de um cristão não residem no quanto eles amam ao Senhor, mas no quanto o Senhor os ama. Nossa paz e alegria não residem no quanto temos feito pelo Senhor, mas no quanto o Senhor tem feito por nós. Dependemos diariamente não do que temos, mas do que Deus é. Precisamos ser libertados de nós mesmos. Precisamos ver Deus à luz do evangelho. Precisamos ver que estamos descansando no que Deus é e no que Ele tem. Estamos dependendo da graça e da misericórdia de Deus. Se virmos isso, não fracassaremos nem ficaremos tristes. Se confiarmos em nós mesmos, achando que somos muito bons e que amamos muito ao Senhor, seremos como areia movediça; não seremos capazes de construir uma casa sobre ela. Não podemos encontrar nenhuma paz e alegria em nós mesmos. Somente podemos encontrá-las no Senhor, em Deus.
É maravilhoso perceber que enquanto vivemos nesta terra, Deus é por nós. Você se lembra das palavras de Romanos 8:31b? “Se Deus é por nós, quem será contra nós?” Não creio que exista uma palavra melhor do que esta para nós. Quando venho partir o pão no domingo, não pergunto a mim mesmo se me portei adequadamente nos últimos dias ou não. Pelo contrário, pergunto se o Senhor tem me amado nos últimos dias. Talvez ultimamente a sua condição tenha sido muito pobre. Talvez ultimamente você tenha estado muito frio em suas emoções. Mas você somente precisa perguntar se o Senhor ainda o ama. Se o Senhor não o ama mais, você pode reter seu louvor. Mas se o Senhor ainda o ama, você tem de louvá-Lo. Você notou como os discípulos que estiveram com o Senhor por três anos e meio no fim ainda eram tão tolos a ponto de questionar acerca de quem era o maior entre eles? Contudo a Bíblia diz que o Senhor, tendo amado os Seus, amou-os até o fim (Jo 13:1). Agradecemos ao Senhor porque tudo depende Dele. Se dependesse do nosso amor, se tivéssemos de confiar em nós mesmos, seria como colocar uma vela num barco e lançá-lo ao mar para navegar em meio a uma tempestade. Você pode imaginar quão instável isso seria? Agradecemos a Deus porque tudo é graça. Tudo depende Dele. Que Deus nos conceda conhecer verdadeiramente as características da graça do Senhor Jesus.
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