Todo mundo tenta salvar a cara da criançada; mas, como já levo pedrada de boca fechada, não custa nada (uma pedra a mais ou a menos) dizer o que penso sobre o assunto. A intenção do texto é questionar os argumentos que quase todo mundo usa para defender uma salvação automática para as crianças. Se você convive com a dúvida, porque experimentou a dor de perder um filho, um bebe principalmente... perdoe-me! Não tenho a intenção de agravar sua dor, não quero trazer aflição para sua alma – caso você não tenha se preocupado com isso até o momento. Não estou escrevendo este texto para você e minha preocupação aqui é mais voltada ao refinamento da “retórica” desse tema do que necessariamente o querer tirar doce, quero dizer, salvação da mão das crianças.
Veja, não estou torcendo pela condenação das crianças, só não aceito os argumentos que são usados para defender a salvação delas. O meu desejo é que todas elas estejam lá, gozando da eterna comunhão com Deus. Como creio num paraíso sem Alzheimer, onde vamos lembrar-nos de nossa vida aqui na terra em detalhes, sem deixar escapar nada, e nos lembraremos, também, das pessoas com quem convivemos, penso na alegria eterna de pais que reencontrarão seus filhos! Meu coração deseja o que todos desejam! Mas, para atender o meu desejo, não posso criar uma “soteriologia” vazia de propiciação, sem Cristo. Esse é o primeiro problema. Na ânsia de defender uma salvação para crianças “inocentes”, as pessoas constroem argumentos completamente vazios de soteriologia coerente, aquela que reflete e atende os requisitos para a salvação como apresentados na Bíblia: não há salvação que não seja por meio de Cristo! Dizer que a criança vai para o céu, automaticamente, porque ela não tem pecado é o mesmo que dizer que a suficiência de sua salvação não foi Cristo! E será mesmo que a criança não tem pecado?
Filho de peixe, peixinho é; filho de pecador, pecador é! Toda descendência de Adão nasce manchada pelo pecado. Adão produziu apenas descendentes carnais – vou desenvolver melhor esse pensamento sobre nascer da carne mais adiante. O que importa no momento é destacar alguns textos que apresentam essa condição de pecado ainda na infância. Aponto para três textos-chaves:
1. “Eu nasci em iniquidade, e em pecado minha mãe me concebeu”. Salmo 51:5
Alguns tentam ler o versículo como sendo o pecado da mãe de Davi e não o dele mesmo. Mas não há referência bíblica de que a concepção de Davi tenha sido fruto de pecado, como foi, por exemplo, o caso do filho de Davi com Bate-Seba – temática do versículo, inclusive. Não é possível admitir, a não ser que seja mesmo por puro pretexto, a interpretação do “em pecado” como sendo da mãe e não do filho. O próprio salmo 51 é a confissão de Davi do seu pecado com Bate-Seba, colocando-se como pecador desde o primeiro verso! Ao dizer que pecou, Davi demonstra que sua natureza é pecaminosa desde a sua concepção – o foco do verso quinto do salmo. Ele não está dizendo que seu filho com Bate-Seba nasceu em iniquidade, e em pecado sua mãe (Bate-Seba) o concebeu. Não! Davi está falando dele mesmo e não do seu filho.
2. “O SENHOR sentiu o aroma suave e disse em seu coração: Não tornarei a amaldiçoar a terra por causa do homem, pois a imaginação do seu coração é má desde a infância; nem tornarei a ferir de morte todo ser vivo, como acabo de fazer”. Genesis 8:21
3. “Os ímpios se desviam desde o ventre; andam errados desde que nasceram, falando mentiras”. Salmo 58:3
Em favor da salvação das crianças, alguns apelam para o texto de 2 Samuel 12:23 – "Todavia, agora que está morta, por que ainda jejuaria eu? Poderei eu fazê-la voltar? Eu irei até ela, mas ela não voltará para mim”.
Bem, as pessoas partem do pressuposto que, sendo Davi um salvo, e a criança dada como morta, Davi só poderia encontrar-se com o filho no céu. Se ele está dizendo que se encontrará com a criança que está morta, a criança só pode ter ido para o mesmo lugar para o qual ele também vai. Mas encontramos algumas complicações para esta interpretação. A) O versículo está sendo interpretado por meio de um salto lógico. Para interpretar o versículo dessa forma, você precisar fazer desdobramentos que vão além do texto. B) A compreensão da vida após a morte como a temos hoje é tardia em relação ao texto de Samuel. Naquela época, numa perspectiva de revelação progressiva, a vida após a morte era ainda uma “teologia” muito obscura. Não estava claro que haveria uma “vida” após a morte. Por isso encontramos declarações no Antigo Testamento como: “Tudo quanto te vier à mão para fazer, faze-o com todas as tuas forças, porque na sepultura, para onde vais, não há trabalho, nem projeto, nem conhecimento, nem sabedoria” - Eclesiastes 9:10 e “O SENHOR Deus sente pesar quando vê morrerem os que são fiéis a ele” - Salmo 116:15.
Compare o que Davi disse, como registrado em 2 Samual 12:23, com Eclesiastes 9:10:
...Eu irei até ela, mas ela não voltará para mim.
porque na sepultura, para onde vais...
O entendimento mais direto, sem a necessidade de desdobramentos, para o texto de 2 Samuel é que Davi falava de “mundo dos vivos” e “mundo dos mortos” (sheol, às vezes traduzido por sepultura). Ele estava vivo, a criança estava morta. Ninguém volta do sheol, mas todos vão para lá. Ela não pode voltar a viver, mas ele um dia morreria. Dizer, nesse momento, que Davi já pensava num céu como apresentado por Cristo no Novo Testamento e desenvolvido na teologia paulina seria um atropelo das coisas.
Por último, quero fazer você pensar no seguinte: recebemos a condenação pelo pecado que cometemos ou pela natureza pecaminosa que herdamos de Adrão? É preciso cometer o ato de pecar para ser condenado? Acredito que estas perguntas foram respondidas indiretamente na conversa de Jesus com Nicodemos em João, capítulo 3.
“Jesus respondeu: Em verdade, em verdade te digo que, se alguém não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito.” João 3:5-6
Jesus e Adão são colocados em contraste, são opostos, no evangelho de João e na teologia paulina. Adão deu origem a descendentes da carne; Jesus, a descendentes espirituais. Adão gera descendentes condenados, Cristo, descendentes justificados.
Romanos 5:14 - "No entanto, a morte reinou de Adão até Moisés, mesmo sobre aqueles que não pecaram à semelhança da transgressão de Adão, que é figura daquele que havia de vir."
1 Coríntios 15:22 - "Pois, assim como em Adão todos morrem, do mesmo modo em Cristo todos serão vivificados."
1 Coríntios 15:45 - "Assim, também está escrito: Adão, o primeiro homem, tornou-se ser vivente, e o último Adão, espírito que dá vida."
Se Jesus afirma que os nascidos da carne são carne e que este nascimento da água e do espírito é posterior ao nascimento da carne, sem o qual não será possível entrar no reino de Deus, a criança também não poderá entrar no reino de Deus sem que antes tenha um nascimento da água e do espírito. Qualquer criança que vem ao mundo é nascida da carne, e ter nascido somente da carne não é garantia de entrada no reino de Deus, pelo contrário, é impedimento!
Não acabe a este texto explorar as justificativas plausíveis para a salvação infantil. A solução para o problema fica para outro artigo. Meu objetivo era somente apresentar as dificuldades de interpretação de alguns textos-chaves e deixar claro por que não compro a ideia de defesa de uma salvação automática para as crianças tão facilmente. Pelo menos, não com esses argumentos...
Veja, não estou torcendo pela condenação das crianças, só não aceito os argumentos que são usados para defender a salvação delas. O meu desejo é que todas elas estejam lá, gozando da eterna comunhão com Deus. Como creio num paraíso sem Alzheimer, onde vamos lembrar-nos de nossa vida aqui na terra em detalhes, sem deixar escapar nada, e nos lembraremos, também, das pessoas com quem convivemos, penso na alegria eterna de pais que reencontrarão seus filhos! Meu coração deseja o que todos desejam! Mas, para atender o meu desejo, não posso criar uma “soteriologia” vazia de propiciação, sem Cristo. Esse é o primeiro problema. Na ânsia de defender uma salvação para crianças “inocentes”, as pessoas constroem argumentos completamente vazios de soteriologia coerente, aquela que reflete e atende os requisitos para a salvação como apresentados na Bíblia: não há salvação que não seja por meio de Cristo! Dizer que a criança vai para o céu, automaticamente, porque ela não tem pecado é o mesmo que dizer que a suficiência de sua salvação não foi Cristo! E será mesmo que a criança não tem pecado?
Filho de peixe, peixinho é; filho de pecador, pecador é! Toda descendência de Adão nasce manchada pelo pecado. Adão produziu apenas descendentes carnais – vou desenvolver melhor esse pensamento sobre nascer da carne mais adiante. O que importa no momento é destacar alguns textos que apresentam essa condição de pecado ainda na infância. Aponto para três textos-chaves:
1. “Eu nasci em iniquidade, e em pecado minha mãe me concebeu”. Salmo 51:5
Alguns tentam ler o versículo como sendo o pecado da mãe de Davi e não o dele mesmo. Mas não há referência bíblica de que a concepção de Davi tenha sido fruto de pecado, como foi, por exemplo, o caso do filho de Davi com Bate-Seba – temática do versículo, inclusive. Não é possível admitir, a não ser que seja mesmo por puro pretexto, a interpretação do “em pecado” como sendo da mãe e não do filho. O próprio salmo 51 é a confissão de Davi do seu pecado com Bate-Seba, colocando-se como pecador desde o primeiro verso! Ao dizer que pecou, Davi demonstra que sua natureza é pecaminosa desde a sua concepção – o foco do verso quinto do salmo. Ele não está dizendo que seu filho com Bate-Seba nasceu em iniquidade, e em pecado sua mãe (Bate-Seba) o concebeu. Não! Davi está falando dele mesmo e não do seu filho.
2. “O SENHOR sentiu o aroma suave e disse em seu coração: Não tornarei a amaldiçoar a terra por causa do homem, pois a imaginação do seu coração é má desde a infância; nem tornarei a ferir de morte todo ser vivo, como acabo de fazer”. Genesis 8:21
3. “Os ímpios se desviam desde o ventre; andam errados desde que nasceram, falando mentiras”. Salmo 58:3
Em favor da salvação das crianças, alguns apelam para o texto de 2 Samuel 12:23 – "Todavia, agora que está morta, por que ainda jejuaria eu? Poderei eu fazê-la voltar? Eu irei até ela, mas ela não voltará para mim”.
Bem, as pessoas partem do pressuposto que, sendo Davi um salvo, e a criança dada como morta, Davi só poderia encontrar-se com o filho no céu. Se ele está dizendo que se encontrará com a criança que está morta, a criança só pode ter ido para o mesmo lugar para o qual ele também vai. Mas encontramos algumas complicações para esta interpretação. A) O versículo está sendo interpretado por meio de um salto lógico. Para interpretar o versículo dessa forma, você precisar fazer desdobramentos que vão além do texto. B) A compreensão da vida após a morte como a temos hoje é tardia em relação ao texto de Samuel. Naquela época, numa perspectiva de revelação progressiva, a vida após a morte era ainda uma “teologia” muito obscura. Não estava claro que haveria uma “vida” após a morte. Por isso encontramos declarações no Antigo Testamento como: “Tudo quanto te vier à mão para fazer, faze-o com todas as tuas forças, porque na sepultura, para onde vais, não há trabalho, nem projeto, nem conhecimento, nem sabedoria” - Eclesiastes 9:10 e “O SENHOR Deus sente pesar quando vê morrerem os que são fiéis a ele” - Salmo 116:15.
Compare o que Davi disse, como registrado em 2 Samual 12:23, com Eclesiastes 9:10:
...Eu irei até ela, mas ela não voltará para mim.
porque na sepultura, para onde vais...
O entendimento mais direto, sem a necessidade de desdobramentos, para o texto de 2 Samuel é que Davi falava de “mundo dos vivos” e “mundo dos mortos” (sheol, às vezes traduzido por sepultura). Ele estava vivo, a criança estava morta. Ninguém volta do sheol, mas todos vão para lá. Ela não pode voltar a viver, mas ele um dia morreria. Dizer, nesse momento, que Davi já pensava num céu como apresentado por Cristo no Novo Testamento e desenvolvido na teologia paulina seria um atropelo das coisas.
Por último, quero fazer você pensar no seguinte: recebemos a condenação pelo pecado que cometemos ou pela natureza pecaminosa que herdamos de Adrão? É preciso cometer o ato de pecar para ser condenado? Acredito que estas perguntas foram respondidas indiretamente na conversa de Jesus com Nicodemos em João, capítulo 3.
“Jesus respondeu: Em verdade, em verdade te digo que, se alguém não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito.” João 3:5-6
Jesus e Adão são colocados em contraste, são opostos, no evangelho de João e na teologia paulina. Adão deu origem a descendentes da carne; Jesus, a descendentes espirituais. Adão gera descendentes condenados, Cristo, descendentes justificados.
Romanos 5:14 - "No entanto, a morte reinou de Adão até Moisés, mesmo sobre aqueles que não pecaram à semelhança da transgressão de Adão, que é figura daquele que havia de vir."
1 Coríntios 15:22 - "Pois, assim como em Adão todos morrem, do mesmo modo em Cristo todos serão vivificados."
1 Coríntios 15:45 - "Assim, também está escrito: Adão, o primeiro homem, tornou-se ser vivente, e o último Adão, espírito que dá vida."
Se Jesus afirma que os nascidos da carne são carne e que este nascimento da água e do espírito é posterior ao nascimento da carne, sem o qual não será possível entrar no reino de Deus, a criança também não poderá entrar no reino de Deus sem que antes tenha um nascimento da água e do espírito. Qualquer criança que vem ao mundo é nascida da carne, e ter nascido somente da carne não é garantia de entrada no reino de Deus, pelo contrário, é impedimento!
Não acabe a este texto explorar as justificativas plausíveis para a salvação infantil. A solução para o problema fica para outro artigo. Meu objetivo era somente apresentar as dificuldades de interpretação de alguns textos-chaves e deixar claro por que não compro a ideia de defesa de uma salvação automática para as crianças tão facilmente. Pelo menos, não com esses argumentos...
Autor: André R. Fonseca
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