quinta-feira, 18 de outubro de 2012

A Eleição é Meio para a Santidade e Não Efeito da Santidade - Agostinho




O Apóstolo diz: Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos abençoou com toda a sorte de bênçãos espirituais, nos céus, em Cristo. Nele ele nos escolheu antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis, diante dele no amor. Ele nos predestinou para sermos seus filhos adotivos por Jesus Cristo, conforme a decisão de sua vontade, para louvor e glória de sua graça com a qual ele nos agraciou no Amado.

 E é pelo sangue deste que temos a redenção, a remissão dos pecados, segundo a riqueza da sua graça que ele derramou abundantemente sobre nós, infundindo-nos toda sabedoria e prudência, dando-nos a conhecer o mistério de sua vontade, conforme decisão prévia que lhe aprouve tomar para levar o tempo à sua plenitude: a de em Cristo recapitular todas as coisas, as que estão nos céus e as que estão na terra. Nele, predestinados pela decisão daquele que tudo opera segundo o conselho de sua vontade, fomos feitos sua herança, a fim de servirmos para o seu louvor e glória (Ef 1,3-12).

Quem, pergunto eu, ao ouvir com atenção e compreensão este testemunho, atrever-se-á a duvidar da verdade tão evidente que defendemos? Deus escolheu em Cristo os seus membros antes da criação do mundo; mas como os escolheria, se não existiam, a não ser predestinando-os?

Os pelagianos argumentam: “Deus sabia de antemão os que se santificariam e permaneceriam sem pecado pelo uso de sua liberdade. Por isso escolheu-os antes da criação do mundo em sua presciência, mediante a qual previu que seriam santos. Portanto, escolheu-os antes que o fossem, predestinando como seus filhos aqueles que sabia em sua presciência que seriam santos e irrepreensíveis. Mas não foi ele que os fez santos e irrepreensíveis, e nem os faria, mas apenas previu que seriam”.

Consideremos as palavras do Apóstolo e vejamos se nos escolheu antes da criação do mundo porque haveríamos de ser santos e irrepreensíveis ou para que o fôssemos. Diz ele: Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos abençoou com toda a sorte de bênçãos espirituais, nos céus, em Cristo. Nele ele nos escolheu antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis. Portanto, não porque seríamos, mas para sermos. Assim, pois, isto é certo e evidente: seríamos santos e irrepreensíveis pelo fato de nos escolher, predestinando-nos para o sermos pela sua graça.

Por isso, nos abençoou com toda a sorte de bênçãos espirituais, nos céus, em Cristo. Nele ele nos escolheu antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis diante dele no amor - Ele nos predestinou para sermos seus filhos adotivos por Jesus Cristo. Prestai atenção ao que acrescenta em seguida: conforme a decisão de sua vontade, para que em tão sublime dom da graça, não nos gloriássemos como se fosse obra de nossa vontade.

E continua: com a qual nos agraciou no Amado, ou seja, agraciou-nos por sua vontade. Assim como disse agraciou pela graça, do mesmo modo se diz: justificou pela justiça. E prossegue: E é pelo sangue deste que temos a redenção, a remissão dos pecados, segundo a riqueza de sua graça, que ele derramou abundantemente em nós, infundindo-nos toda sabedoria e prudência, dando-nos a conhecer o mistério de sua vontade, conforme decisão prévia que lhe aprouve tomar.

 Neste mistério de sua vontade depositou as riquezas de sua graça segundo seu beneplácito e não segundo a nossa vontade, a qual não poderia ser boa, se ele não a socorresse segundo seu beneplácito para ser boa. Pois, depois de ter dito: conforme decisão prévia, acrescentou: que lhe aprouve tomar no Filho amado, para levar o tempo à sua plenitude: a de em Cristo recapitular todas as coisas, as que estão nos céus e as que estão na terra. Nele, predestinados pela decisão daquele que tudo opera segundo o conselho de sua vontade, fomos feitos sua herança, a fim de servirmos para o seu louvor e glória.

Seria prolixo discorrer sobre cada palavra. Mas percebeis, sem ter nenhuma dúvida, com quanta evidência do testemunho apostólico a graça de Deus é defendida, esta graça contra a qual se levantam os merecimentos humanos, como se o homem desse algo primeiramente para algo receber em retribuição. Portanto, Deus nos escolheu em Cristo antes da fundação do mundo, predestinando-nos para sermos seus filhos adotivos, não porque seríamos santos e irrepreensíveis por nossos méritos, mas escolheu-nos e predestinou-nos para o sermos.

Assim agiu segundo o seu beneplácito para que ninguém se glorie em sua vontade, mas na de Deus; agiu assim segundo as riquezas de sua graça, conforme o seu beneplácito, que se propôs realizar em seu Filho amado, no qual fomos feitos seus herdeiros, predestinados segundo o beneplácito, e não o nosso, daquele que tudo opera a ponto de operar em nós mesmos o querer (Fl 2,13). Mas opera segundo o conselho de sua vontade, a fim de servir - mas para o seu louvor e glória.

Esta é a razão pela qual afirmamos que ninguém procure nos homens motivo de orgulho (lCor 3,21), e, portanto, nem em si mesmo, mas aquele que se gloria, se glorie no Senhor (lCor 1,31), para servirmos para seu louvor e glória. Ele opera conforme a decisão de sua vontade para servirmos para seu louvor e glória, como santos e irrepreensíveis, motivo pelo qual nos chamou, predestinando-nos antes da fundação do mundo. Conforme esta decisão de sua vontade efetua-se a vocação dos eleitos, para os quais tudo coopera para o bem, porque foram chamados segundo o seu desígnio, e os dons e a vocação de Deus são sem arrependimento.

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