quarta-feira, 3 de outubro de 2012


Não Julgueis

Há alguma parte das Escrituras tão popular e tão erroneamente cita­da como as palavras de Mateus 7.1 ("Não julgueis, para que não sejais julgados.")? Estas palavras têm sido adotadas como um fundamento para uma abordagem permissiva e sem criticismo da vida, de uma mentalidade "tudo é aceitável", que nunca forma, e muito menos expressa, uma opi­nião desfavorável das coisas ou das pessoas.
Pessoas que nunca têm tempo para Jesus estão prontas a citar es­tas palavras—a fim de silenciar aque­les que são antiquados demais por usar termos como "pecado" e "erro". "Não julgueis" é o porrete que ataca os padrões éticos e os transforma em confusão improdutiva.
Até os crentes sentem-se fre­qüentemente intimidados, ao pensar que o Senhor nos está proibindo, com estas palavras, de formular vereditos morais. Durante casos de disciplina na igreja local, há poucas oca­siões em que este versículo não é mencionado, como forma de protes­to da parte de uma das ovelhas.

Julgamento — bom ou mau

Um momento de reflexão deve nos mostrar que tal interpretação é absurda. Nesta passagem, o próprio Cristo exige que façamos julgamen­tos. "Não deis aos cães o que é san­to, nem lanceis ante os porcos as vossas pérolas... Acautelai-vos dos falsos profetas... Pelos seus frutos os conhecereis" (Mt 7.6, 15, 16).
Ele nos ordena que julguemos "pela reta justiça" (Jo 7.24). E Paulo esperava que os membros da igreja julgassem "os de dentro" (1 Co 5.12). As pessoas hoje estão à deriva, sem bússola, nos mares do "não fazer jul­gamentos".
Precisamos mais do verdadeiro julgamento nos tribunais, mais de fibra moral nos governos e, acima de tudo, mais discernimento crítico en­tre o povo de Deus. Nosso Senhor certamente não estava nos exortan­do à ingenuidade.
O que Ele queria dizer? Estava nos advertindo a respeito do julga­mento errado — um espírito insen­sível e condenador que incorre na ira de Deus. É uma tentação particular para aqueles que realmente se preo­cupam com o certo e o errado, que têm padrões éticos elevados e acei­tam com seriedade a chamada à san­tidade.
Ao nosso redor, existem muitas coisas dignas de condenação. Algu­mas coisas devem ser condenadas, por amor ao nosso próximo e por causa da glória de Deus. Mas temos de acautelar-nos de julgar da manei­ra que Cristo proíbe.

Sinais de advertência

Podemos identificar o julgamento pelas seguintes características. Devemos concluir se esta advertên­cia de Cristo se aplica ao nosso jul­gar:
Quando é habitual. O Senhor estava falando a respeito de uma ati­vidade contínua. "Não continueis. Não crieis o hábito de julgar." Fre­qüentemente, você mais critica do que elogia? As pessoas esperam que você sempre diga algo negativo? Você tem medo de usar sua língua? Você é um inveterado descobridor de erros?
Quando é desnecessário. Com que freqüência nos pronunciamos a respeito de assuntos que não nos competem! Se não lhe pediram, por que ofereceu uma opinião desfavo­rável? Sede diligentes "por viver tran­qüilamente, cuidar do que é vosso e trabalhar com as próprias mãos, como vos ordenamos" (1 Ts 4.11).
Quando está alicerçado em in­formações incompletas. Em geral, os nossos julgamentos são assim. Apresso-me em proferir uma críti­ca? Conheço todos os fatos? "Res­ponder antes de ouvir é estultícia e vergonha" (Pv 18.13).
Quando está cheio de presun­ção. Podemos ver o que as pessoas fazem, mas temos pouca ou nenhu­ma idéia quanto ao motivo por que o fazem. Portanto, não ousemos im­putar motivos, embora o façamos com regularidade. "Eu, o Senhor, esquadrinho o coração" (Jr 17.10).
Quando não há misericórdia. Somos tolerantes? Demonstramos o benefício de duvidar das informações recebidas? Tentamos dar a melhor interpretação às informações? Cre­mos na máxima de que "todos são inocentes, até que se prove o con­trário"?
Quando traz satisfação. O amor "não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade" (1 Co 13.6). Aqueles espasmos íntimos de satisfação que sentimos, quando recontamos, com piedosas expressões de pesar, a queda de alguém no pe­cado, vêm diretamente do inferno.
Quando é trivial. "Ninguém, pois, vos julgue por causa de comida e bebida, ou dia de festa, ou lua nova, ou sábados" (Cl 2.16). Quantos conflitos existem, nas igrejas, a respeito de assuntos insignificantes e duvidosos.
Quando é incoerente. "Portanto, és indesculpável, ó homem, quando julgas... porque, no que julgas a outro, a ti mesmo te condenas; pois praticas as próprias coisas que con¬denas" (Rm 2.1).
Quando é destrutivo. Ataca as pessoas ("E quem lhe chamar: Tolo" — Mt 5.22); destrói a auto-estima; ousa pronunciar um veredito final sobre o ser humano. "O próprio Deus" é Juiz (Sl 50.6).

AUTODESTRUTIVO

A tendência de sempre julgar é autodestrutiva. É claro que pode causar danos àqueles contra os quais é dirigido — às vezes, de um modo severo e duradouro. Disfarçado de interesse ou de espiritualidade sincera, este espírito cruel se infiltra como um ácido corrosivo na membresia de muitas igrejas, prejudicando vidas e causando feridas.
E esta tendência prejudica também a pessoa que faz o julgamento. Condenar os outros pode ser uma atividade agradável para os incrédulos, oferecendo o que John Stott chama de "o prazer da justiça própria, sem a dor do arrependimento". Mas a atitude de julgar nos impede de perceber qualquer necessidade de mudança.
Enquanto pudermos achar um argueiro no olho de nosso irmão, não nos preocuparemos com a trave que está em nosso próprio olho. Por conseguinte, o crítico persistente tem um interesse firme em achar falhas nos outros. Se não tiver um motivo de acusação, procurará outro imediatamente.
E essa estratégia de autoproteção condena sua vítima à miserável prisão dos padrões de comportamento mundanos.

NEGAR MISERICÓRDIA

Contudo, existe uma implicação ainda mais séria: "Não julgueis, para que não sejais julgados. Pois, com o critério com que julgardes, sereis julgados; e, com a medida com que tiverdes medido, vos medirão também" (Mt 7.1-2).
Você e eu gostaríamos de ser julgados de acordo com nossos próprios padrões? Suportaríamos ouvir nossos juízos serem recompensados e medidos por esses padrões?
Condenar significa negar misericórdia. Aqueles que condenam habitualmente os outros fazem uma declaração terrível a respeito de si mesmos — não sabem o que é misericórdia.
É o fardo da culpa interior que os torna propensos a fazer julgamentos?
Bem-aventurados os misericordiosos,
 porque alcançarão misericórdia. Mateus 5.7

FONTE: Edward Donnelly – Fé Para Hoje Nº 30

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