Antes de uma definição significativa do pecado é válido buscar informações tanto no Velho como no Novo Testamento, com a intenção de buscar informações que revelem a realidade do pecado.
Conceito no Velho Testamento
No Velho Testamento podemos encontrar as seguintes palavras normalmente encontradas com o sentido de pecado:
hatah – significa basicamente errar, tornar-se culpado;
heth’ – erro, malogro;
awon – iniqüidade;
pesha – transgressão, infração;
Nos profetas do Antigo Testamento, o pecado é muito mais que uma violação de regras, mas significa o rompimento de um relacionamento pessoal com Deus. Isso poder ser observado em Is.59.2:
Mas as vossas iniqüidades fazem separação entre vós e o vosso Deus; e os vossos pecados encobrem o seu rosto de vós, para que vos não ouça.
Assim, no Velho Testamento é claro que pecado é visto como uma transgressão direta à Lei de Deus, evidenciado por um erro moral que torna culpado diante de Deus.
Conceito no Novo Testamento
No Novo Testamento podemos ressaltar as seguintes palavras:
hamartano: não acertar o alvo, atingir alvo errado;
hamartia: transgressão, pecado. Normalmente visto como atos específicos;
Especialmente na literatura paulina, o pecado é observado como uma força em si, que opera no homem e o mantém cativo. Por vezes o pecado é personificado, como em Rm.7.20:
Mas, se eu faço o que não quero, já não sou eu quem o faz, e sim o pecado que habita em mim.
Segue-se que no Novo Testamento podemos perceber que o pecado é não acertar o alvo correto. Ou seja, não é um ato passivo, mas uma intenção determinada em não se conformar com a Lei preestabelecida. Assim, após observar o uso das palavras, uma definição de pecado pode ser assim esboçada:
“Tudo aquilo que não redunda em, ou contribui para, a Glória de Deus. É um mal orientado contra Deus, que envolve ato, natureza e culpa[1]“. (cf. 1Jo.3.4)
A abrangência do conceito do pecado pode ser observada pelo texto de 1Co.10.31, que diz: “Portanto, quer comais, quer bebais ou façais outra coisa qualquer, fazei tudo para a glória de Deus“. O que se nota neste texto é que mesmo as atividades mais simples, como comer e beber, podem ser maculadas pela presença de motivos ou propósitos distintos ao padrão estabelecido no referido versículo. Ou seja, qualquer atividade que não tenha como motivo primeiro a Glória de Deus, É PECADO! Assim, o pecado pode ser observado como a incapacidade de viver em conformidade com o que Deus espera de nós no que diz respeito a ATO, NATUREZA e a CULPA.
Ato
Ações que não se conformam com a vontade de Deus; qualquer falta de conformidade ativa com a lei moral de Deus. Essas ações podem ser praticadas ou não, pois segundo Tg.4.17, não fazer o que se deve fazer é pecado. Ou seja, omitir-se de responsabilidades é PECADO. Diante desse fato, qual é a relação entre o cristão e o pecado como Ato?
TEXTOS
IMPLICAÇÕES
1Jo.1.10
O cristão não está livra da prática do pecado.
Jo.3.6
Neutralização[2] do poder do pecado na vida do cristão.
2Co.3.18
A santificação pressupõe a imperfeição moral de crente.
Ef.4.17-29
O cristão deve abandonar os atos.
1Jo.2.6
Deve imitar a Cristo em sua vida.
Em caso do cristão incorrer na prática do pecado ele pode confessar. Em 1Jo.1.9, a palavra utilizada é “ovmologe,w” (omologéo), de onde procede nossa palavra HOMOLOGAR. Ou seja, a confissão de pecado nada mais é do que dizer a mesma coisa, ou falar em conformidade, ou conformar-se, ou concordar com o que a Palavra de Deus diz e reconhecer sua falha em arrependimento. Entretanto, é necessário que cristão não apenas confesse o pecado, mas também deixe o pecado:
O que encobre as suas transgressões jamais prosperará; mas o que as confessa e deixa alcançará misericórdia (Pr.28.13).
Mas, a essa altura é necessário que se diga que a disposição de Deus em perdoar não serve como desculpa, ou estímulo para a prática do pecado:
Todo aquele que permanece nele [em Cristo] não vive pecando; todo aquele que vive pecando não o viu, nem o conheceu (…) Aquele que pratica[3] o pecado procede do diabo, porque o diabo vive pecando desde o princípio. Para isto se manifestou o Filho de Deus: para destruir as obras do diabo. Todo aquele que é nascido de Deus não vive na prática de pecado; pois o que permanece nele é a divina semente; ora, esse não pode viver pecando, porque é nascido de Deus. (1Jo.2.7-9).
Natureza
É uma inclinação herdada, dedes Adão, potencialmente presente em todos, para a prática do mal orientado contra Deus. Essa inclinação herdada é também chamada de “pecaminosidade”, e afeta o homem como um todo. Assim, nesse ponto as motivações são tão perniciosas quanto as ações.
Mas é importante ressaltar que não atinge apenas o homem como um todo, mas todo homem. Dessa forma, todo ser humano possui de maneira completa esta inclinação. Ou seja, “não é simplesmente que somos pecadores por que pecamos; [mas] pecamos por que somos pecadores[4]“. É o que Paulo afirma em Ef.2.3: “e éramos, por natureza, filhos da ira[5], como também os demais“.
O pecado, visto como essa inclinação, é considerado estúpido, por que não anula a consciência do homem. Em Rm. 7.15-17 podemos ler:
Porque nem mesmo compreendo o meu próprio modo de agir, pois não faço o que prefiro, e sim o que detesto. 16 Ora, se faço o que não quero, consinto com a lei, que é boa. 17 Neste caso, quem faz isto já não sou eu, mas o pecado que habita em mim
Sobre isso R.C. Sproul diz:
Parece estupidez fazermos algo que sabemos que vai roubar-nos a felicidade. Contudo o fazemos. O mistério do pecado não é somente o fato da ser perverso e destrutivo, mas de ser estúpido[6].
O crente possui uma Nova Natureza, mas não anulou a Antiga Natureza pecaminosa, que ainda existe substancialmente: “Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena” (Cl.3.5). Com a conversão a Natureza Pecaminosa recebe um golpe substancial, embora não deixe de existir.
Culpa
O conceito de culpa nos dias atuais é visto de uma perspectiva incorreta, e por esse motivo leva a uma realidade também erronia sobre essa ela. Após o advento dos estudos de Freud, a culpa passou a ser vista como um sentimento irracional que não merece atenção, pois não prestamos contas a mais ninguém além de nós mesmos e algumas pessoas ao nosso redor. Assim, se ninguém é prejudicado por uma atividade pessoal, não existe motivo para ter culpa.
Contudo, a perspectiva teológica aborda a questão a partir da isenção de dignidade que o homem sofre diante de Deus. Portanto, culpa é mais que errar, executar algo mau ou sentir-se mal por isso, mas é o resultado da violação original da Lei Moral de Deus, e atinge judicialmente a todos os descendentes de Adão. Assim, a Culpa do Pecado provem do ato rebelde de Adão, e é imposta a todo o qualquer ser humano, de maneira que, esta redunda diretamente em condenação.
Resumo
O Ato é Pessoal –> Agrava a condenação
A Natureza é Herdada –> Viabiliza a execução do Ato
A Culpa é Imposta –> Gera Condenação
[1] GRANCONATO, Marcos Mendes. Teologia Sistemática 3, material não publicado.
[2] Neutralização não total, parcial.
[3] A idéia presente nesta palavra é a “prática constante” do pecado.
[4] ERICKSON, Millard J., Introdução à Teologia Sistemática.
[5] A expressão “filhos da ira” traz em si a idéia de “merecedor da ira”.
[6] SPOUL, R.C., Santidade de Deus.
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