quinta-feira, 18 de outubro de 2012

ANANIAS E SAFIRA: A GRANDE MENTIRA.


Para quem se interessa em buscar provas de que o Livro dos Atos é de fato um livro digno de crédito, consola-o anotar aqui que Lucas está escrevendo de fato história e não ficção. Está pintando um quadro real e não imaginário. Aquele pe­cado dentro da comunidade cristã era muito mais aflitivo do que a perseguição que vinha de fora. Lucas levanta o pano para nos mostrar a hipocrisia, a murmuração (cap; 6), a dissensão e os duros atritos (cap. 15) havidos entre os crentes. Muitas vezes ele nos mostra o estreito nacionalismo de alguns.

O pecado básico de Ananias e Safira foi o da hipocrisia, ou o esconder a realidade; pois estavam vivendo uma mentira. A tentativa deles, de serem elogiados através duma atitude enganosa, fora plano deliberado, pois que "concordaram juntos" (5:9). Em o Novo Testamento nenhum pecado se considera mais grave e sério do que o da cegueira voluntária para com a verdade, ou a rejeição dela. Aqueles que crucificaram a Jesus o fizeram com seus olhos deliberadamente fechados à verdade e ao direito, e se disse que o pecado que não tem perdão está ligado a essa disposição de espírito.

 Pode-se defender de algum modo o pecado de ignorância ou de fraqueza; mas, nada se pode apresentar em defesa da cegueira voluntária para com a verdade ou da voluntária rejeição da luz. Se o castigo de Ananias e Safira nos parece rigoroso de mais, devemos reconhecer que o conceito que aqui se tem da desonestidade operando nos fundamentos do caráter do indivíduo não é menos rigoroso do que o conceito que encontramos refletido nos Evangelhos. O pecado contra o Espírito Santo — a deliberada rejeição daquilo que é reto e verdadeiro — é indesculpável. O pecador, se o abandona, pode ser perdoado; mas, o pecado em si não tem escusa.

Um pecado ainda mais grave podemos encontrar em 5:3, dependendo da tradução correta do texto. O caso acusativo, e não o dativo usual, segue ao verbo no infinito comumente traduzido por "mentir". É possível traduzir então assim: "Ananias, como é que Satanás encheu o teu coração para falsificar o Espírito Santo...?" A acusação consistia não só em ter ele mentido ao Espírito Santo, mas em ter falsificado o Espírito, buscando representar a sua fraudulenta ação como de certa forma inspirada pelo Espírito. Assim, procurara ele fazer com que o Espírito Santo participasse do seu nefando crime.

O sepultamento de Ananias sem que sua mulher o soubesse (5:7) vai além de nossa compreensão. Era costume enterrar o morto no dia em que morria. Mas, era legal ou direito enterrar o marido sem o conhecimento da esposa? Esta é uma das muitas perguntas que os Atos deixam sem resposta. Não temos uma resposta satisfatória para esta pergunta. Basta-nos lembrar que Lucas estava interessado em responder às perguntas dele e não às nossas. A nossa curiosidade se aguça em muitas partes do livro apenas para quedar-se sem eco, porque o propósito de Lucas, ao escrever, não era satisfazer nossa curiosidade. Quando o Livro dos Atos termina sem qualquer palavra sobre o resultado do processo de Paulo, Lucas estava, é claro, outra vez preocupado com coisas inteiramente vitais ao seu propósito, e não com a idéia de responder a todas as nossas perguntas.

Desta história da morte súbita de Ananias e sua mulher surge um pensamento muito sério atinente à moral cristã. Aquela punição com a morte foi apenas o efeito dum ato arbitrário de Pedro, divinamente autorizado, ou foi Deus mesmo Quem os puniu? Essa interpretação — e outras passagens do Novo Testamento possivelmente sustentem este ponto de vista (ver I Cor. 5:5; 11:30; I Tim. 1:20; Tiago 5:20; I João 5:16 em diante) — nos põe diante dum problema muito grave acerca do modo pelo qual Deus trata o mal. O conceito que prevalece em o Novo Testamento parece ser esse de que a ira é uma lei que opera naturalmente e não arbitrariamente; e de que o pecado é em si uma coisa tão séria que acarreta suas próprias conseqüências.

 Muitos concluem que Ananias e Safira morreram de choque nervoso, ou traumatismo, e não em conseqüência dum arbitrário decreto de Deus. Se for verdadeira esta idéia, podemos mais facilmente harmonizá-la com todo o ensinamento do Novo Testamento. Tais mortes podem ser explicadas pela psicologia. Muitos sinais que se deram naqueles dias fizeram com que todos os crentes tivessem plena consciência de que o poder de Deus estava de fato operando no meio deles, e isso encheu os corações deles de pasmo e temor. A rápida revelação do pecado de Ananias contra Deus mui facilmente teria produzido o choque que o levou a morte. Safira experimentou aquele choque e também o choque resultante da notícia da morte do marido.

Fonte: Frank Stagg – O Livro de Atos dos Apóstolos.

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