sábado, 28 de setembro de 2013

A Diferença Entre Filosofia e Teologia - Carlos Spitzweg


Embora não fique claro à primeira vista por que é necessário fazer essa distinção, esclarecer o papel apropriado da Filosofia e da Teologia – e quais suas diferenças – é algo que eu gostaria de comentar nesse post.

Basicamente, podemos dizer que a diferença principal entre fazer filosofia e fazer teologia são os seus “pontos de partida”. A Filosofia parte “apenas” do instrumentos da razão e das informações obtidas pelas nossas faculdades cognitivas (em um sentido mais restrito). Já a Teologia parte – sem excluir o uso dos instrumentos da filosofia, é claro – adicionando a Bíblia ou a revelação de alguns princípios cristãos (ou analogamente para as outras religiões).

Se, ao fazer um argumento, uma das premissas estiver derivada de uma revelação, então o argumento será teológico; se não estiver, então caímos no campo da filosofia.
Essa é uma das maneiras de demarcar as disciplinas. Como explica o professor Plantinga (embora eu não esteja certo que essa seja exatamente sua posição) em um artigo:

Filosofia é um assunto puramente racional. Isso não é meramente negar que ela seja irracional (uma negação que os familiarizados principalmente com a Filosofia Francesa contemporânea podem ser perdoados por ouvir com certo ceticismo); é, ao invés, é dizer que na filosofia uma pessoa permanece apenas na razão, não empregando nenhuma informação de fé. Na filosofia, você abstrai aquilo que conhece pela fé; se você utilizar alguma coisa que você conhece pela fé (por exemplo, algumas doutrinas específicas do Cristianismo) para responder um problema, o resultado não será filosofia, mas teologia.

Ou seja:
  • (a) Argumentação baseada apenas do que é acessível diretamente pela razão (Filosofia);
  • (b) Argumentação baseada nas premissas da Bíblia ou do Cristianismo (Teologia Bíblica/Cristã);
Observe que isso não quer dizer que a Teologia não seja racional ou ainda dizer que uma pessoa não possa racionalmente chegar a aceitar o Cristianismo. Essa distinção se refere apenas ao fato de que nenhuma pessoa que pensar duramente numa ilha vai conseguir concluir que “Aha! Deus foi crucificado em uma região árida do mundo para salvar dos nossos pecados! Agora tudo faz sentido!”.
Esse tipo de coisa, claramente, não é deduzível só por nosso conhecimento direto do mundo, ao contrário dos assuntos discutidos na filosofia (a princípio).

Mas qual é o importância, nem que seja aparente, de se fazer essa distinção?

Devemos lembrar que as percepções estão influenciadas, pelo menos de alguma forma, pelo ambiente cultural. E nesse contexto, dois pontos devem ser lembrados:

Primeiro, um caminho possível para alguém para chegar ao Cristianismo é a Filosofia. Discussões sobre a existência de Deus ou a justificativa para se aceitar o Cristianismo são assuntos debatidos filosoficamente. Essas discussões ajudam as pessoas a mudar de posição ou, ao menos, a deixar o neo-ateísmo e passar a respeitar os religiosos.
 Se você usar argumentes teológicos nesse debate, estará errando o escopo e perdendo a chance de fazer a coisa certa (a não ser, é claro, que alguém esteja fazendo uma pergunta sobre a coerência interna da religião, onde o uso da Teologia está justificado). O risco do efeito contrário (descrédito) ser gerado é ainda maior.

Segundo, a Teologia é rejeitada a priori por alguns debatedores. E um dos motivos pelo qual as pessoas compram tal idéia é a IGNORÂNCIA quanto ao âmbito justificado da Teologia.
 Sabendo o papel apropriado da Teologia, não há como criticá-la. Mas aquele que não sabe, corre o risco de ver a Teologia ridicularizada (pois obviamente discussões sobre “transubstanciação” ou coisa do tipo para um ateu ou um agnóstico podem soar ridículas, à primeira vista; [1]) e passar a dispensá-la. Depois, atribui-se todos os esforços de respostas de religiosos aos “teólogos” que: (a) serão visto como parte “interessada”, ao contrário do outro, que é objetivo (ou “cientista”); (b) malucos que passam o dia falando apenas de besteiras e invenções.

Para ilustrar meu ponto,  observe, por exemplo, o tratamento de Dawkins dado aos teólogos:

“Suspeito que os dois astrônomos estavam, mais uma vez, recuando para ser polidos: os teólogos não têm nada de útil a dizer sobre mais nada; vamos jogar um bolinho para eles e deixá-los preocupados com uma ou duas perguntas a que ninguém consegue responder, e talvez jamais conseguirá. Ao contrário de meus amigos astrônomos, não acho nem que devamos jogar um bolinho para eles.”

Richard Dawkins depois chama Richard Swinburne de “teólogo”, sempre que os principais trabalho de Richard Swinburne são de filosofia.
 Motivo para isso? Dado o comportamento geral de Dawkins, então podemos suspeitar que o termo “teólogo” foi usado como ARMA de ridicularização. O leitor já iria ler e pensar: “Ah, esses teólogos…”.
 Dessa forma, o trabalho filosófico sofisticado de alguém como Richard Swinburne é tomado como nem digno de nota. O objetivo neo-ateísta é alcançado plenamente.

Injusto? É claro.

Previsível? Não podemos dizer que não.

Se a demarcação do campo dessas disciplinas estiver bem realizada, então os efeitos podem ser mitigados. A compreensão correta ajuda na apologética – seja na positiva (argumentação a favor), seja na negativa (demonstração de que as críticas são infundadas). Então tenha isso em mente para evitarmos confusões.

Notas: 
1 - Deixo claro que eu não estou dizendo que são,de fato, ridículas; só estou tentando imaginar o que passa na cabeça de uma pessoa com uma “framework” diferente. 

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