sábado, 16 de fevereiro de 2013

INTRODUÇÃO À 1 PEDRO (Parte 1) - Por Leonardo Dâmaso



INTRODUÇÃO À PRIMEIRA CARTA DE PEDRO
(1.1-2)

1. O AUTOR DA CARTA (1.1a)

      Nos tempos antigos, quando se escrevia uma carta, era costume do autor, logo de início, se apresentar e informar o destinatário da carta. Sendo assim, o autor desta carta se apresenta com o nome de Pedroapóstolo de Jesus Cristo...


     a) Pedro. Pedro nasceu na cidade de Betsaida, na Galiléia (Jo 1.44). Era filho de João e irmão de André, que também era um discípulo e apóstolo de Cristo (Mt 10.3). Pedro foi um homem simples e trabalhava como pescador antes de ser chamado por Cristo (Mt 4.19), assim como o seu irmão André, Tiago e João, que também eram pescadores (veja Mt 4.18-22; Mc 1.16-20; Lc 5.3-11; Jo 21.1-14).   
     Antes de ser um apóstolo cheio do Espírito Santo, de coragem e intrepidez, e um grande líder na igreja em Jerusalém, Pedro, quando era ainda um discípulo do Senhor Jesus, demonstrou inúmeras fraquezas e imperfeições de caráter. Senão vejamos algumas delas:
    
     i. Pedro foi um homem inconstante que oscilava entre a fé e a incredulidade. Ao mesmo tempo em que andou sobre as águas pela fé na palavra de Jesus: Vem! (Mt 14.29); contudo, quando olhou para a tempestade e a força do vento ao seu redor, o medo e a incredulidade fizeram com que Pedro afundasse. No entanto, Jesus toma Pedro pela mão e o salva de morrer submergido pelas águas (vs.30-31).   

      ii. Pedro foi um homem precipitado nas palavras. Pedro falava por muitas vezes sem pensar e sem refletir. Foi assim quando ele recebeu a revelação divina confessando que Jesus era “o Cristo, o filho do Deus vivo” (Mt 16.16). Em seguida, após esta inebriante confissão de Pedro, Jesus revela aos discípulos que fazia parte do propósito de Deus ele sofrer em Jerusalém, ser morto e ao terceiro dia ressuscitar (vs.21). Em vista disso, Pedro, sem discernimento algum e não refletindo nas palavras de Jesus, age precipitadamente baseado na sútil cosmovisão humanista e maligna de Satanás sussurrada em sua mente (vs.23) e censura Jesus, afirmando que ele não passaria por todo aquele sofrimento que o levaria a morte (vs.22). Ou seja, que Jesus não merecia passar por tudo aquilo que ele disse. Que Jesus não precisaria ser tão radical a este ponto! Pedro foi precipitado nas palavras não se dando conta que “emprestou sua boca” para Satanás tentar a Cristo. (veja também Jo 13.1-11, outro evento em que Pedro se precipita nas palavras).

     iii. Pedro foi um homem explosivo e precipitado nas atitudes. Além de ser precipitado nas palavras, Pedro também costumava agir no impulso da emoção do momento. A precipitação de Pedro nas palavras culminava na precipitação nas atitudes. Quando Jesus foi preso no Getsêmani por uma turba de soldados romanos e oficiais do templo (Jo 18.3) liderados e enviados da parte dos líderes religiosos ­– os principais sacerdotes, escribas, fariseus e anciãos (Mt 26.47; Mc 14.43), Pedro, ao mesmo tempo com medo e com raiva, resistindo a situação tenta impedir Jesus de ser levado preso. Ele puxa a sua espada e corta a orelha do servo do sumo sacerdote chamado Malco (Jo 18.10; Mt 26.51; Mc 14.47; Lc 22.50). Pedro agiu de maneira carnal! Ele não vigiou conforme Jesus havia exortado os discípulos que o fizessem (Mt 26.41; Lc 22.45-46).         
     Pedro se precipitou sendo explosivo e valente por não haver entendido até então o propósito de Deus. Não obstante o próprio Jesus o repreende e sintetiza que era necessário que isso acontecesse para se cumprir o que havia sido determinado por Deus na Escritura, isto é, que o seu sofrimento, morte e ressurreição faziam parte do processo da redenção dos pecadores (Mt 26.52-53; Jo 18.11).       

     iiii. Pedro foi um homem auto confiante. Na noite em que seria preso e entregue nas mãos dos líderes religiosos e de Pilatos para ser humilhado, ultrajado, espancado e morto na cruz, Jesus alerta Pedro e os demais discípulos que todos iriam se escandalizar nele (Mt 26.31). 

    No grego, o verbo escandalizar σκανδαλίζω significa induzir ao pecado, fazer desviar; denota “infidelidade ou ser infiel”. Ou seja, “os discípulos foram desleais a Jesus Cristo ao sentir em relação a ele uma espécie de repulsa e ao fugir na hora da sua provação maior”.1 Esta passagem poderia ser traduzida desta forma: Esta noite ainda, todos vocês (os onze discípulos) serão infiéis a mim...

     Em seguida, Jesus continua dizendo que após a sua ressurreição ele iria ao encontro dos discípulos na Galiléia (vs.32). Depois desta contundente afirmação, Pedro, equivocado, diz: Ainda que todos se escandalizem em ti, eu nunca me escandalizarei ARC (vs.33). Jesus responde a Pedro: Em verdade te digo que, nesta mesma noite, antes que o galo cante, três vezes me negarás ARC (vs.34). Pedro replica: Ainda que me seja necessário morrer contigo, não te negarei... ARC (vs.35). Em (Lc 22.33) vemos um detalhe desta afirmação de Pedro omitida por Mateus onde ele diz: Senhor, estou pronto a ir contigo, tanto para a prisão como para a morte. ARA

     Pedro confiou em si mesmo. Ele pensava que se conhecia (Jr 17.9-10). Pedro superestimou a si mesmo. Ele negou o seu nome, suas convicções, sua fé e o seu Senhor três vezes (Mc 14.66-72). Por falta de um conhecimento amplo da Escritura no que tange a providência divina e por causa do seu orgulho, Pedro duvidou das palavras de Jesus e caiu radicalmente da fé.

        iiiii. Pedro foi um homem covarde. Com muita propriedade, Hernandes Dias Lopes escreve:

    Depois que Cristo foi levado para a casa do Sumo Sacerdote, Pedro mergulhou nas sombras da noite e seguia a Jesus de longe. Sua coragem desvaneceu. Sua valentia tornou-se covardia. Seu compromisso de ir com Cristo para a prisão e para a morte foi quebrado. Sua fidelidade incondicional ao Filho de Deus começou a enfraquecer. Não queria perder Jesus de vista, mas também não estava disposto a assumir os riscos de sua ligação com ele 2 (veja Lc 22.54-62).


     iiiiii. A restauração de Pedro. No momento que era para demonstrar sua fé com toda coragem e convicção, Pedro faz o contrário, ele nega o Senhor Jesus diante dos homens. Imagine se você estivesse lá naquele dia e visse o comportamento pífio de Pedro e as coisas absurdas que ele falou para dar força a sua negação? Foi exatamente isso que ele fez!
    
     Na primeira negação descrita em (Mt 26.69-70), Pedro mente afirmando que não conhecia a Jesus. Ele se fez de desentendido na frente de duas criadas e de um pequeno grupo de criados que não lhe representavam praticamente nenhuma ameaça. Não havia nada que sugerisse que aqueles criados fariam algo contra Pedro se ele admitisse ser um discípulo de Jesus. “Se essa fosse a intenção deles, teriam imediatamente chamado os oficiais da corte apenas por acharem que Pedro era um dos discípulos de Jesus”.3

       Na segunda negação Pedro jurou que estava dizendo a verdade (vs.71-72): Não conheço tal homem! Todavia, essa negação foi mais grave do que a primeira. John Macarthur salienta que um juramento literalmente envolve pedir a Deus para ser testemunha de veracidade da declaração de alguém. Na sociedade judaica, um juramento era considerado um compromisso extremamente sagrado com a verdade. Dizer uma mentira com um juramento falso era tomar o nome de Deus em vão da maneira mais blasfema possível, era fazer Deus uma testemunha da mentira.Sendo assim, o pecado de Pedro nesta segunda negação foi voluntário e deliberado, ou seja, ele negou Jesus por vontade própria sem nenhum constrangimento e de maneira intencional. 

       Na terceira negação Pedro pragueja dizendo (vs.73-74): Não conheço esse homem! O praguejar e o jurar, segundo John Macarthur, provavelmente não eram as vulgaridades e as imprecações grosseiras que normalmente associamos com essas expressões. Antes, isso significa que Pedro pronunciou maldição contra si mesmo, expressando a esperança de que ele morreria violentamente pelas próprias mãos de Deus se estivesse mentindo. Contudo, ele fez ainda mais um juramento – suscitando novamente o testemunho de Deus – de que ele não conhecia Jesus. Esse era o tipo mais forte de juramento que é possível fazer. 5 O medo de ser preso, espancado e morto pelas autoridades fez com que Pedro saísse fora de si. Ele só pensava em sair daquela situação ileso. Pedro naquele momento perdeu completamente o senso da realidade divina e o temor a Deus. Este, portanto, é o retrato do ostensível e desviado Pedro!

     Não obstante, após o canto do galo (Mt 26.74; Mc 14.71-72; Jo 18.26-27), Jesus, voltando da casa do sumo sacerdote Caifás, olha fixamente nos olhos de Pedro que estava no pátio de sua casa (Lc 22.61-62). Este olhar de Jesus despertou a consciência de Pedro e fez com que ele se lembrasse das suas palavras lhe advertindo da negação em (Mc 14.72):Antes que o galo cante duas vezes, três vezes me negarás. Note que depois que Pedro se lembrou destas palavras, o texto diz na parte final que ele, caindo em si, começou a chorar. Almeida Século 21 Depois de se lembrar das palavras de Jesus, Pedro se deu conta do que havia feito e chorou amargamente por tê-lo negado. Agora, depois de reconhecer o seu pecado, Pedro percebe no olhar de Jesus a censura pela sua negação, porém uma censura com amor.
     O Senhor Jesus confronta Pedro apenas pelo olhar. Era como se ele dissesse: Por que você me negou depois de ter me confessado como o filho do Deus vivo? Por que você se recusou em dizer que me conhecia e que era meu discípulo para as pessoas que lhe perguntaram isso? Lembra que você fez uma solene promessa de que nunca me negaria? 

      Acerca disso, Heber Carlos de Campos escreve:

    Cristo olhou de modo penetrante e poderoso para levar o seu discípulo à realidade do seu pecado. Ele fixou os olhos em Pedro para conscientizá-lo e lembra-lo do que ele havia feito. Este poder de Jesus foi usado para causar o sentimento triste e, ao mesmo tempo, mais glorioso de fazer com que alguém se volte do seu pecado para Deus. Pedro não suportou o poder daquele olhar. Aquele olhar de Jesus desnudou a sua alma aflita e deixou claro para ele mesmo a hediondez do seu pecado, o que fez com que ele se voltasse para Cristo.6

    Pedro com certeza entendeu o significado do olhar de Jesus. Foi este olhar disciplinador e amoroso que o capacitou para que mais que mais tarde ele se convertesse ou retornasse a fé (Lc 22.31-32). O canto do galo não teria levado Pedro ao arrependimento se não fosse o olhar penetrante e restaurador de Jesus. O verdadeiro Pedro não é aquele que negou à Jesus, mas aquele que se arrependeu do seu pecado.
    Doravante a esta cena, Jesus então é crucificado e morto. Após a sua ressurreição, Maria Madalena, Salomé e Maria, mãe de Tiago vão até o sepulcro onde Jesus fora enterrado. Ambas foram lá no domingo bem cedo ungir o seu corpo.  De repente um anjo aparece a elas e diz algo curioso em (Mc 16.7): Vão e digam aos discípulos dele (de Jesus) e a Pedro: Ele está indo adiante de vocês para a Galiléia. Lá vocês o verão, como ele lhes disse. NVI Por que o anjo não disse: Vão e digam aos discípulos dele somente?

Por que o anjo não disse: Vão e digam aos discípulos dele e a João, que era o discípulo amado de Jesus? Por que o anjo fez questão de enfatizar e a Pedro? O que havia de tão importante em Pedro que Jesus queria que ele, em especial, soubesse acerca da sua ressurreição?
     Aquele olhar penetrante, confrontador, disciplinador e também amoroso e restaurador de Jesus com certeza abalou profundamente a Pedro, que dali em diante não foi mais a mesma pessoa. Hernandes Dias Lopes corrobora que Pedro chegou a ponto de desistir de tudo. Desistiu de ser discípulo. A única coisa que sabia fazer era chorar amargamente e alagar o seu leito com suas lágrimas. Mesmo Pedro tendo desistido de si mesmo, Jesus não desistiu de Pedro. Jesus não abdicou do direito de ter Pedro ao seu lado. Por isso, mandou-lhe um recado pessoal através do anjo (Mc 16.7).7  

     F.F Bruce sintetiza:

       Aparentemente, Pedro exerceu liderança entre os companheiros mesmo durante o ministério de Jesus. No entanto, os discípulos poderiam ter achado que, a partir do momento em que ocorreu o episódio no terraço do palácio sacerdotal – quando Pedro negou a Cristo – seu direito de liderança tivesse cessado. Os quatro evangelistas indicam, de maneiras distintas, que foi da vontade do próprio Cristo que Pedro exercesse o papel de líder.Jesus perdoou, levantou e restaurou Pedro do opróbrio e da vergonha.

     Por fim, em uma das várias manifestações públicas após a sua ressurreição, Jesus aparece pela terceira vez a alguns dos discípulos (Jo 21.14), dessa vez no mar de Tiberíades. Foi neste evento que Jesus comissionou Pedro novamente a apascentar as suas ovelhas (Jo 21.15-17). 


Extraído de: http://www.materiasdeteologia.com

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