segunda-feira, 16 de julho de 2018

Não em Palavra, mas em Poder - Vincent Cheung

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“Mas, em breve, irei visitar-vos, se o Senhor quiser, e, então, conhecerei não a palavra, mas o poder dos ensoberbecidos. Porque o reino de Deus consiste não em palavra, mas em poder” (1 Coríntios 4:19-20).


“Respondeu-lhes Jesus: Não provém o vosso erro de não conhecerdes as Escrituras, nem o poder de Deus?” (Marcos 12:24).

Eu ouvi um pastor afirmar que era o “poder” e não as “palavras” que Paulo valorizava. Ele então disse que esse “poder” é algo que devemos praticar, visto que recebê-lo autoridade para fazê-lo. Façanhas sobrenaturais parecem ser de maior prioridade para ele do que as “palavras” (evangelho ou doutrina). Mas se não estou enganado, “a palavra da cruz... é o poder de Deus” (1 Coríntios 1:18- 31).

Assim, aqui está minha pergunta: a aplicação do versículo feita pelo pastor está correta?

É verdade que os Reformados e Evangélicos freqüentemente negligenciam o poder miraculoso de Deus, e o excesso carismático os assusta ainda mais. Muitos deles parecem crer somente nas atividades “ocultas” de Deus, tais como a conversão e a providência. Alguns deles falam como se esse tivesse se tornado um universo deísta desde os dias dos apóstolos. Estou fazendo uma generalização – essa acusação não se aplica a todo o mundo. Em todo o caso, vários aspectos-chave da teologia Reformada e Evangélica do poder miraculoso precisam ser revisados, pois são absolutamente anti-bíblicos e preconceituosos. Sim, podemos denunciar os carismáticos quanto quisermos, mas simplesmente porque dizemos que um grupo está errado não significa que o outro esteja certo, e simplesmente porque falamos sobre o poder miraculoso não significa que precisamos usar os carismáticos como o nosso modelo. Mas ainda  precisamos de uma teologia verdadeiramente bíblica sobre o assunto.

Dito isso, a passagem de 1 Coríntios está se referindo a outra coisa. O contexto é primordial. Para parafrasear: “O reino de Deus não é simplesmente conversa, mas ele transmite poder real”. Ou, como a NIV coloca: “Porque o reino de Deus não é uma questão de conversa, mas de poder”. Isso é dito contra a ostentação dos coríntios, que desafiavam a autoridade de Paulo. O versículo 19 refere-se às “palavras daqueles que são arrogantes” (NASB). Assim, Paulo não está dizendo: “O reino de Deus não é uma questão de doutrina, mas de poder”, visto que ele não está fazendo um contraste entre as palavras de Deus e o poder de Deus, mas está se referindo às palavras arrogantes dos coríntios. Todavia, a declaração estabelece o ponto que as coisas que pertencem ao reino de Deus são poderosas e eficazes.

Já o versículo com o pronunciamento de Jesus significa o que ele diz. Deveríamos conhecer tanto “as Escrituras” como “o poder de Deus”. Novamente, observe o contexto. Ele está falando àqueles que negavam a doutrina da ressurreição, e dessa forma, negavam a palavra e o poder de Deus. Assim, eles desconheciam ambas as coisas.

Quanto ao “a palavra da cruz… é poder de Deus” (1 Coríntios 1:18-31) – sim, mas não nos equivoquemos. Devemos admitir que existem tais coisas como manifestações miraculosas do Espírito, e mesmo que sejam usadas para vindicar “a palavra da cruz” às vezes, elas mesmas não são “a palavra da cruz”. Mesmo um cessacionista deve crer que pelo menos algumas pessoas na Bíblia manifestaram poder divino de acordo com a vontade de Deus, e isso não é o mesmo que pregação. Usar essa passagem para refutar o pastor seria tirá-la do contexto, assim como ele tirou do contexto a outra passagem de Coríntios.

Resumindo, embora eles tenham uma teologia muito desenvolvida de conversão, santificação e providência, os cristãos Reformados e Evangélicos tendem a negligenciar o poder miraculoso de Deus e falham em entender suas operações. A teologia deficiente deles sobre o assunto os torna incapazes de explicar muitas passagens bíblicas, e freqüentemente os levam até mesmo a distorcer essas passagens para manter a visão deles, ou a consigná-las a um antigo passado irrelevante, de forma que eles não mais precisam tratar com elas.

Assim, existe a necessidade de abandonar algumas linhas de pensamento tradicionais, porém anti-bíblicas, mas isso não significa que seguimos os carismáticos, visto que eles não nos dão um bom modelo de interpretação e implementação bíblica. De fato, ao construir um entendimento bíblico sobre o assunto, não é preciso nem mesmo mencioná-los, mas muitas pessoas conectaram tão inseparavelmente os dois em suas mentes que não são mais capazes de confrontar o que a Bíblia realmente ensina. O assunto todo foi corrompido por eles. E algumas vezes o que nos é apresentado é uma exegese ruim, juntamente com um raciocínio defeituoso e uma grande quantia de incredulidade.

Então, o que se segue abaixo não é um argumento conclusivo, nem mesmo um argumento bíblico, mas algo sobre o qual se pensar:

Muitos daqueles que consideramos como heróis da fé na história da igreja de fato não afirmaram o cessacionismo rígido e extremo que se tornou tão popular hoje, e que se tornou até mesmo um teste de ortodoxia em alguns círculos. Considere Agostinho, Lutero, Calvino, Spurgeon, Edwards e Lloyd-Jones. Vários outros indivíduos significantes poderiam ser mencionados como contra-exemplos, mas então você poderia ficar surpreso ao ler suas biografias e diários. Algumas vezes isso é mencionado como uma de suas imperfeições, mas sugiro que foi a fé sóbria deles no poder presente e ativo de Deus – sim, mesmo em manifestações miraculosas – que tornou o seu caráter forte e a sua obra eficaz. 
Por exemplo, tanto Spurgeon como Llloyd-Jones falaram sobre uma “unção” ao pregar. Isso é algo tão real que o ministro é consciente dela quando está presente, e quando ela é forte ou fraca. Mas muitos têm rejeitado todo o conceito, atribuindo-o ao misticismo carismático. Muitos desses pregadores e teólogos respeitados também falaram sobre um chamado para o ministério segundo o padrão daqueles sobre quem lemos na Bíblia, embora concordando que a revelação escrita estava completa. Mas isso tem sido rejeitado também. Será que as pessoas pensam que este ministério funciona com um senso de autoridade e direção simplesmente por causa do meu caráter natural ou mesmo por pura arrogância?

Além do mais, existe freqüentemente um duplo padrão quando diz respeito a esse assunto. Se Spurgeon diz algo sobre a obra do Espírito em seu ministério, então isso é genialidade pura. Se Mueller relata como Deus respondeu suas orações de uma maneira espetacular e mesmo miraculosa, ficamos impressionados e inspirados. Mas se alguém que ainda não obteve o status de ídolo – ou que ainda esteja vivo – faz uma declaração como a de Spurgeon ou conta uma história como a de Mueller, então ele deve ser um herege carismático. Enquanto essas coisas inconfortáveis permaneçam no passado, mesmo no passado recente, estamos contentes, mas Deus é agora proibido de fazer as mesmas coisas que fez na Escritura. Como ele ousaria agir soberanamente e acabar com a nossa tradição?

O misticismo carismático é certamente anti-bíblico e destrutivo, mas conspirar contra o poder de Deus não é de todo melhor. É um testamento da graça e fidelidade de Deus que a igreja tem sobrevivido debaixo de tanta incredulidade – ora, isso é um sinal e uma maravilha!



Tradução: Felipe Sabino
Via: Monergismo

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