sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Barrabás

NO. 595
Um sermão pregado na manhã de Domingo de 16 de Outubro, 1864
Por Charles Haddon Spurgeon
No Tabernáculo Metropolitano, Newington, Londres.

“Então todos tornaram a clamar dizendo: Este não, mas Barrabás. E Barrabás era ladrão” João 18:40.
O costume de soltar um prisioneiro no dia da Páscoa tinha, sem dúvida, o propósito de ser um ato de graça da parte das autoridades romanas para com os judeus, e pelos judeus poderia ser aceito como um ato atencioso pelo motivo de sua Páscoa. Posto que nesta data eles mesmos foram tirados da terra do Egito, poderiam considerar que era sumamente conveniente que algum prisioneiro obtivesse sua liberdade.
Todavia, não havia nenhuma provisão para isto na Escritura; não havia sido ordenado por Deus, e sem dúvida, deve ter gerado algum efeito pernicioso para a justiça pública, que a autoridade governante soltasse um criminoso, sem tomar em conta seus crimes ou seu arrependimento: o deixavam em liberdade na sociedade simples e exclusivamente pelo fato de que um certo dia deveria ser celebrado de uma maneira peculiar.
Posto que algum prisioneiro deveria ser solto no dia da Páscoa, Pilatos pensa que agora tem uma oportunidade de permitir que o Salvador escape sem necessidade de comprometer em absoluto sua reputação diante das autoridades de Roma. Pilatos pergunta ao povo a qual dos dois prefere dar a sua liberdade, a um notório ladrão que se encontrava até então sob custódia, ou ao Salvador.
É provável que Barrabás fosse detestável para a multidão até esse momento; e contudo, apesar de sua anterior antipatia, a turba, instigada pelos sacerdotes, esquece todas as suas culpas, e prefere a ele em lugar do Salvador.
Não podemos saber exatamente quem era Barrabás. Seu nome, como o entenderão em um momento, ainda que não tenham o menor conhecimento do hebraico, significa: “filho de pai”. “Bar” significa “filho”, como quando Pedro é chamado Simão Barjonas, filho de Jonas; e a outra parte de seu nome: “Abbas”, que significa “pai”. “Abbas” é a palavra que nós usamos em nossas aspirações de filhos: “Abba, Pai!”
Então, Barrabás é o “filho de seu pai”; e algumas pessoas propensas ao misticismo opinam que há aqui uma imputação de que era particular e especialmente um filho de Satanás. Outros conjecturam que é um nome de carinho, que lhe foi dado porque era o preferido de seu pai, uma criança mimada; o filho do papai, como costumamos dizer; e estes escritores agregam que as crianças mimadas muitas vezes se tornam imitadoras de Barrabás, e são as pessoas mais propensas a tornarem-se daninhas para o seu país, e se convertem em aflições para seus pais, e maldições para todos os que as rodeiam. Se assim fosse, tomando este caso em conexão com o caso de Absalão, e especialmente o dos filhos de Elí, é uma advertência para os pais para que não errem esbanjando uma excessiva clemência a seus filhos.
Nos parece que Barrabás cometeu pelo menos três crimes: foi encarcerado por homicídio, por sedição e por rebelião, que constituíam certamente uma lamentável combinação de ofensas; facilmente poderíamos sentir piedade pelo progenitor de tal filho.
Este infeliz é apresentado e é posto a competir contra Cristo. Se apela à turba. Pilatos crê que por causa do sentido de vergonha, realmente seria impossível que preferissem a Barrabás; mas eles estão tão sedentos de sangue contra o Salvador, e estão tão influenciados pelos sacerdotes que, em uníssono – não parecia que houvesse nem uma só voz que se opusesse, nem uma mão que se alçasse em contra – com uma surpreendente unanimidade de maldade, eles gritam: “Não a este, senão a Barrabás”, ainda que soubessem – pois ele era um notável ofensor bem conhecido – que Barrabás era um assassino, um canalha e um traidor.
Este fato é muito significativo. Há mais ensinamento nele do que à simples vista poderíamos imaginar. Não temos aqui, antes de mais nada, neste ato de liberar ao pecador e de condenar ao inocente, uma espécie de tipo dessa grandiosa obra que é realizada pela morte do nosso Salvador? Nós poderíamos de forma muito justa pararmos ao lado de Barrabás. Temos roubado de Deus a Sua glória; temos agido como sediciosos traidores contra o governo do céu: se todo aquele que aborrece a seu irmão é homicida, nós também somos culpáveis desse pecado. Aqui estamos diante do tribunal; o Príncipe da Vida está atado por nossa causa e não se nos permite que saiamos livres. Deus nos liberta e nos absolve, enquanto o Salvador, sem mancha nem pecado, nem sequer com uma sombra de uma falta, é conduzido à crucificação.
Duas aves eram tomadas no ritual de limpeza de um leproso. Uma ave era sacrificada, e seu sangue era derramado em um vaso de barro; a outra ave era molhada neste sangue, e logo, com suas asas avermelhadas, era deixada em liberdade para que voasse no campo. A ave morta retrata bem ao Salvador, e cada alma que por fé foi submersa em Seu sangue, voa ao alto, até o céu, cantando docemente no gozo da liberdade, devendo sua vida e sua liberdade inteiramente a Ele, que foi imolado.
Se reduz a isto: Barrabás deve morrer ou Cristo deve morrer; tu, pecador, deves morrer, ou Cristo Emanuel, o Imaculado, deve morrer. Ele morre para que nós sejamos postos em liberdade.
Oh! Nós temos uma participação nesta salvação hoje? E ainda que tenhamos sido ladrões, traidores e homicidas, podemos regozijar porque Cristo nos libertou da maldição da lei, havendo sido feito maldição por nós!
A transação tem todavia outra voz. Este episódio da história do Salvador mostra que ao juízo do povo, Jesus Cristo era um maior ofensor do que Barrabás; e por uma só vez posso aventurar-me a dizer que a vox populi (a voz do povo), que em si mesma foi à mais infame injustiça – se lermos à luz da imputação dos nossos pecados a Cristo – foi a vox Dei (a voz de Deus). Quando Cristo esteve coberto com os pecados de Seu povo, teve mais pecados postos sobre Ele do que os que descansavam sobre Barrabás. Não há pecado nEle, Ele era completamente incapaz de converter-se em um pecador: santo, inocente e puro é Cristo Jesus, mas Ele assume a carga inteira da culpa de Seu povo sobre Si mesmo por imputação, e quando Jeová o vê, vê mais culpa posta sobre o Salvador do que a culpa que está sobre este atroz pecador, Barrabás. Barrabás sai livre, inocente, em comparação com o tremendo peso que repousa sobre o Salvador. Pensem então, amados, quão baixo se abateu seu Deus e Senhor para ser assim contado com os iníquos. Watts expressou energicamente, mas me parece que não demasiadamente enérgico:
“Sua honra e Seu alento
Ambos lhe foram arrebatados,
Em Sua morte foi unido aos malvados,
E foi envilecido como eles.”

Ele era tudo isso na estima do povo e diante do tribunal de justiça, pois os pecados de toda a companhia dos fiéis foram postos sobre Ele. “Jeová levou nele o pecado de todos nós.” Nenhum coração poderia conceber quanta terá sido essa iniquidade, nem nenhuma língua poderia dizê-lo. Meçam pelas dores que suportou, e então, se puderem adivinhar quais foram essas dores, será possível formar alguma idéia de qual haverá sido a culpa que o abateu diante do tribunal de justiça abaixo do próprio Barrabás. Oh! Quanta condescendência há aqui! O justo morre pelos injustos. Ele leva o pecado de muitos, e ora pelos transgressores.
Ademais, me parece que há uma terceira lição, antes de passar para a parte do texto que quero enfatizar. Nosso Salvador sabia que Seus discípulos seriam odiados pelo mundo muito mais do que os notórios pecadores de todas as épocas. Muitas vezes o mundo esteve mais disposto a tolerar aos homicidas, aos ladrões e aos bêbados do que aos cristãos; e retribuiu a alguns dos melhores e mais santos homens de forma que foram tão caluniados e abusados, que seus nomes foram eliminados como um sinônimo de depravação, indignos de serem inscritos na mesma lista com os criminosos.
Agora, Cristo santificou estes sofrimentos de Seu povo da calúnia de seus inimigos, suportando Ele mesmo precisamente esses sofrimentos, de tal maneira que, irmãos meus, se vocês ou eu fôssemos acusados de crimes que aborrecemos, e se nosso coração estivesse a ponto de estourar debaixo do peso da acumulação do veneno da calúnia, poderíamos levantar nossas cabeças e sentir que em tudo isto contamos com um companheiro que tem a verdadeira comunhão conosco, o Senhor Jesus Cristo, que foi rejeitado quando Barrabás foi escolhido.
Não esperem um melhor tratamento que o Seu Senhor. Recordem que o discípulo não é maior que seu Mestre. Se ao pai de família chamaram Belzebu, quanto mais aos de sua casa? E se preferem o homicida ao invés de Cristo, pode não estar distante o dia em que preferirão um assassino ao invés de ti.
Me parece que estas coisas jazem na superfície; agora chego ao nosso tema mais imediato, Primeiro, consideraremos ao pecado segundo está na história evangélica; em segundo lugar, observaremos que este é o pecado de todo o mundo; em terceiro lugar, que nós mesmos fomos culpáveis deste pecado antes de nossa conversão; e em quarto lugar, que este é, assim o tememos, o pecado de muitíssimas pessoas que estão presentes aqui nesta manhã: falaremos com elas e contenderemos, pedindo que o Espírito de Deus transforme seus corações e os conduza a aceitar ao Salvador.

I. Então, poderia ser útil passar uns quantos minutos CONSIDERANDO O PECADO CONFORME O ENCONTRAMOS NESTA HISTÓRIA.
Eles preferiram a Barrabás e não a Cristo. O pecado será visto mais claramente, se recordarmos que o Salvador não havia feito nenhum mal. Ele não havia quebrantado nenhuma lei de Deus ou de homem. Ele poderia ter utilizado em verdade palavras de Samuel: “Aqui estou: atestem contra mim diante de Jeová e diante de seu ungido, se tomei o boi de alguém, se tomei o asno de alguém, se caluniei a alguém, se agravei a alguém, ou se de alguém tomei suborno para cegar meus olhos com ele; e eu os restituirei”.
Dentro de toda essa multidão reunida, não havia ninguém com a presunção de acusar ao Salvador de lhe ter feito algum dano. Longe disso, não podiam senão reconhecer que Ele lhes havia conferido grandes bênçãos temporais. Oh, multidão voraz, acaso não te alimentou quando estavas faminta? Acaso não multiplicou os pães e os peixes para ti? Não curou aos leprosos com Sua mão? Não lançou fora de seus filhos e filhas aos demônios? Não fez andar seus paralíticos? Não lhes deu vista a seus cegos e não abriu os ouvidos de seus surdos? Por quais destas boas obras conspiram para matar-lhe?
Em meio desta multidão congregada havia alguns, sem dúvida, que lhe deviam bênçãos inestimáveis, e contudo, ainda que todos eles soubessem que eram Seus devedores, clamavam contra Ele como se fosse o pior problema de suas vidas, uma praga ou uma peste para o lugar em que habita.

Acaso era de Seu ensinamento de que se queixavam? Em qual ponto de Seu ensinamento ofendia a moralidade? Em qual ponto ia contra aos melhores interesses do homem? Se vocês observam o ensinamento de Cristo, nunca houve nada semelhante, incluso se é julgado quanto ao alcance de sua promoção do bem-estar humano. Aqui estava a essência e substância de Sua doutrina: “Amarás ao Senhor teu Deus com todo o teu coração… e ao teu próximo como a ti mesmo”.
Seus preceitos eram da forma mais benigna. Acaso lhes ordenou que desembainhassem a espada e expulsassem aos romanos, ou que se lançassem em uma impiedosa carreira de carnificina e rapina? Acaso os estimulou para que soltassem as rédeas de suas desenfreadas paixões? Lhes disse que buscassem primeiro que nada sua própria vantagem e que não se preocupassem pelo bem-estar do vizinho?
Não, cada estado justo há de reconhecer-lhe como seu melhor pilar, e o ajuntamento da humanidade há de reconhecer-lhe como seu conservador; e contudo, apesar de tudo isto, ali os temos, oprimido por seus sacerdotes, buscando Seu sangue, e gritando: “Seja crucificado! Seja crucificado!”.

Evidentemente Seu único propósito era o bem deles. Para quê pregava? Nenhum motivo egoísta poderia ser argumentado. As raposas tinham tocas, e as aves do céuninhos, mas Ele não tinha onde recostar Sua cabeça. A caridade de uns quantos discípulos foi a única forma que preveniu a fome absoluta. As frias montanhas e o ar da meia-noite foram testemunhas do fervor de Suas solitárias orações pelas multidões que agora o odiavam. Ele viveu para outros: eles podiam ver isto; não poderiam observá-lo durante os três anos de Seu ministério, sem dizer: “jamais viveu uma alma tão abnegada como esta”; eles deviam saber, a maioria deles, e o resto poderia ter sabido, se houvessem perguntado, ainda que fosse superficialmente, que Ele não tinha nenhum propósito de nenhum tipo para estar na terra, exceto o de buscar o bem dos homens.
Por qual destas coisas eles clamam para que seja crucificado? Por qual de Suas boas obras, por qual de Suas palavras generosas, por qual de Suas santas ações cravarão Suas mãos na tábua, e Seus pés no madeiro? Com ódio irracional, com insensível crueldade, a única resposta a pergunta de Pilatos: “Pois que mal há feito?”, Foi: “Seja crucificado! Seja crucificado!”
A verdadeira razão de seu ódio, sem dúvida, consistia no ódio natural de todos os homens à perfeita bondade. O homem sente que a presença do bem é um testemunho silencioso contra seu próprio pecado, e por isso anela se desfazer dele. Ser demasiado santo no juízo dos homens é um grande crime, pois censura seu pecado. Ainda que o santo não tenha o poder da palavra, contudo, sua vida é um ruidoso testemunho a favor de Deus contra os pecados de Suas criaturas.
Este protesto inconveniente conduz aos malvados a desejar a morte do Santo e do Justo. Ademais, os sacerdotes os respaldavam. Ainda que seja algo triste e lamentável, ocorre muitas vezes o caso de que as pessoas seja melhor que seus mestres religiosos. Neste momento presente os laicos da Igreja da Inglaterra, como um todo, têm consciências honestas, e gostariam que seu Livro de Oração fosse revisado amanhã mesmo se suas vozes pudessem ser escutadas. Mas aos seus clérigos lhes importa demasiadamente pouco a verdade, e não são muito escrupulosos como juram ou com quem se associam. Enquanto sua Igreja puder se manter unida, o padre Ignacio será escutado em suas assembleias, enquanto o chamado de Cristo à igreja para que se purifique, somente desperta ressentimento e má vontade. Não importa que as gargantas de certos clérigos sejam exercitadas em assobiar por um instante a aparição do audaz monge anglicano, ele é um deles, um irmão de sua própria ordem, e sua igreja é responsável por tudo o que ele faz. Deixem que eles saiam e se separem, e então saberemos que aborrecem este moderno papado; mas enquanto estiverem sentados na mesma assembleia e forem membros da mesma igreja, o pecado lhes pertence, e não cessaremos de denunciar tanto ao pecado como a eles. Se os clérigos evangélicos permanecem em comunhão com os papistas, agora que se manifestem a plenas cores, vou deixar de afirmar que violam suas consciências, mas me vou permitir duvidar que tenham uma consciência em absoluto.
Irmãos, todavia sucede que as pessoas seja melhor que seus mestres. Estas pessoas não haveriam crucificado a Cristo se os clérigos dessa época, os sacerdotes, os dotados ministros não houvessem gritado: “Seja crucificado!” Ele era o Dissidente, o herege, o cismático, o perturbador de Israel. Ele era o que clamava a alta voz contra das falhas da ordem estabelecida da sociedade. Ele era o que não podia ser reprimido, o ignorante da Galiléia, que continuava clamando contra eles, o homem prejudicial, e por isso gritavam: “Seja crucificado! Seja crucificado! Qualquer castigo é suficientemente bom para o homem que fala acerca da necessidade de reformas, e advoga por mudanças nas regras estabelecidas.
Sem dúvida o suborno foi também usado neste caso. Acaso o rabi Simão não pagou a multidão? Acaso não havia uma esperança de um festejo depois que a Páscoa terminasse para aqueles que usaram suas gargantas contra o Salvador? Ademais, toda a multidão se havia lançado nessa direção; e se alguém tivesse compaixão, preferiria ficar calado. Dizem sempre que: “a prudência é a melhor parte da coragem”; e na verdade devem existir muitos homens valorosos, pois possuem a melhor parte da coragem que é a prudência. Se não se uniram nos gritos, ao menos não incomodariam aos outros, e assim não houve senão um só grito: “Morra! Morra! Não convêm que viva”.
Que concentrado escárnio se encontra neste versículo quarenta. Não dizem: “este Jesus”, pois não queriam manchar suas bocas com Seu nome, senão a este, “este demônio”, se vocês quiserem. A Barrabás outorgam o respeito de mencionar seu nome; mas “este”, a quem odeiam tanto, não se rebaixariam a mencioná-lo. Temos visto este grande pecado, então, como está na história.

II. Mas agora vejamos, em segundo lugar, COMO ESTE INCIDENTE EXPÕE O PECADO QUE TEM SIDO A CULPA DO MUNDO EM TODAS AS ÉPOCAS, E QUAL É A CULPA DO MUNDO AGORA.
Quando os apóstolos saíram a pregar o Evangelho, e a verdade se espalhou ao largo de muitos países, os imperadores romanos emitiram severos editos. Contra quem foram feitos estes editos? Acaso foram contra os malvados ofensores desses dias? É bem sabido que o Império Romano inteiro estava infestado de vícios de tal magnitude que a face da modéstia se ruborizaria ao escutar sua simples menção.
O primeiro capítulo da Epístola aos Romanos é um quadro gráfico resumido do estado da sociedade ao largo de todos os domínios romanos. Quando essas severas leis foram concebidas, por quê não foram proclamadas contra estes atrozes vícios? É pouco conveniente que os homens que são culpáveis de crimes tais como os que o apóstolo Paulo mencionou, fiquem sem castigo, mas eu não encontro editos contra essas coisas. Encontro que foram perdoados e pouco mencionados com censura e que mais bem a fogueira, os arrastões utilizando as patas de cavalos selvagens, a espada, a prisão, as torturas de todo tipo, contra quem vocês creem que eram usados? Contra os inocentes e humildes seguidores de Cristo, que distante de se defenderem, estavam dispostos a sofrer todas estas coisas, e se ofereciam como ovelhas para o matadouro, dispostas a suportar a faca do açougueiro.
O grito do mundo nas perseguições da Roma Imperial era: “Cristo não, mas os sodomitas, os assassinos e os ladrões sim; nós somos mais indulgentes com qualquer destes, mas não com Cristo; eliminemos da terra a Seus seguidores”. Logo o mundo mudou suas táticas, se tornou nominalmente cristão, e o Anticristo apareceu em toda a sua glória blasfema. O Papa de Roma se cingiu da tríplice coroa, e se autonomeou o Vigário de Cristo; logo entrou a abominação da adoração aos santos, aos anjos, às imagens e aos quadros; logo veio a missa, e não sei que outras coisas mais, de detestável erro, e o que disse o mundo? “O Papado para sempre!” Todo joelho se dobrou e cada cabeça se inclinou diante do soberano representante de Pedro em Roma. A igreja de Roma igualava em pecado a Barrabás; não, estou fazendo um elogio a Barrabás quando o menciono na mesma categoria com muitos dos papas, pois o caráter deles era imundo e negro do princípio ao fim, até o ponto que aqueles que supersticiosamente os consideravam infalíveis em seu ofício, não podiam defender seus caracteres pessoais.
O mundo escolheu a prostituta de Roma, e a que estava ébria com o vinho de sua abominação, tinha todos os olhares postos sobre ela com admiração, enquanto o Evangelho de Cristo era esquecido, sepultado em uns quantos livros velhos, ficando quase extinto na obscuridade. Desde aquele dia o mundo mudou duas táticas outra vez; em muitas partes da terra o protestantismo é abertamente reconhecido, e o Evangelho é pregado, mas o que se passa então? Então entra Satanás, e outro Barrabás, o Barrabás do mero cerimonialismo e da mera assistência a um lugar de culto é entronizado. “Sim, nós somos ortodoxos; muito ortodoxos, muito puros. Sim, nós somos religiosos, estritamente religiosos, assistimos à nossa casa de reunião, ou vamos na nossa igreja. Nunca estamos ausentes. Cuidamos de todas as formas, mas carecemos da vital piedade; não nascemos de novo; não passamos da morte para a vida. Contudo, isso bastará; contanto que sejamos tão bons como nossos vizinhos, e guardemos o ritual externo, o interno não importa”.
Isto, que é um detestável roubo da glória de Deus, isto que mata as almas dos homens, é o Barrabás da época presente. Um nome exterior para viver é estabelecido, e é recebido por aqueles que estão mortos; e muitos de vocês que estão presentes agora estão muito tranquilos e contentes, e ainda que não sentiram nunca ao vivificador Espírito de Deus, e ainda que não tenham sido lavados no sangue expiatório, estão satisfeitos porque tomam um assento em algum lugar de adoração; dão sua moeda de oferta, sua doação a algum hospital ou sua subscrição para algum bom propósito, esquecendo e descuidando de lembrar que todo o processo de limpeza do vaso e do prato jamais servirá de nada, a menos que a natureza interior seja renovada pelo Espírito do Deus vivente. Este é o grande Barrabás da época presente, e os homens o preferem antes que ao Salvador.
Eu creio que posso provar, mediante um simples fato, que isto é verdade: que o mundo realmente ama ao pecado mais do que ao Cristo. Você terá observado algumas vezes que alguns cristãos são inconsistentes, não é certo? Sua inconsistência não seria algo muito grande, se a julgasse em conformidade com as regras ordinárias de conduta. Mas você está muito consciente de que um homem mundano pode cometer qualquer pecado que queira sem receber maior censura; mas se o cristão comete um pecado muito pequeno, então alçam as mãos, e o mundo inteiro grita: “Vergonha!” Eu não quero mudar isso, mas quero dizer somente isto: “ali está o senhor Fulano de Tal, que se sabe que vive uma vida desenfreada, perversa, libertina; bem, eu não vejo que seja universalmente marginalizado ou reprovado, senão muito ao contrário, é tolerado pela maioria, e até admirado por alguns”.
Mas suponha que um cristão, um professante bem conhecido, houvesse cometido alguma falta que, comparada com isso, não fosse digna de menção, e o que lhe ocorre? “Publiquem-no! Publiquem-no! Souberam do que fez o senhor Fulano de Tal? Souberam desta hipócrita transgressão?” “Bem, de quê se tratou?” Você analisa: “bem, está mal, está muito mal, mas comparada com o que você diz dela, não é nada em absoluto”.
Portanto, o mundo mostra pela diferença entre a maneira com que julga ao homem religioso que professa, e a maneira com que julga aos seus, que realmente pode tolerar aos mais dissolutos, mas não pode tolerar aos cristãos. O cristão, por suposto, nunca se verá completamente libre de imperfeições, a inimizade do mundo não é evidentemente contra as imperfeições do cristão, pois pode tolerar maiores imperfeições em outros; a objeção será portanto contra o homem, contra a profissão que assumiu, e o curso que deseja seguir.
Vigiem cuidadosamente, amados, para que não lhes dar nenhuma oportunidade nesse sentido; mas quando verem que o mais leve erro é tomado e exagerado, nisto encontram uma clara evidência de que o mundo prefere a Barrabás ao invés dos seguidores do Senhor Jesus Cristo. Agora o mundo mudará seus diversos modos de tratar-nos, mas nunca amará a igreja mais do que o faz agora. Não esperamos ver ao mundo empurrado para cima para ver-se mais absorvido dentro da igreja. A união do mundo com a igreja nunca foi o propósito da nossa religião. O propósito de Cristo é reunir para Si um povo dentre os homens; não se trata do levantamento de todos, senão do chamamento de alguns; se trata de fazer com que os homens difiram; se trata da manifestação da graça especial e distinguidora, e da reunião de um povo que formou para Si.
Neste processo a moralidade é promovida, os homens são civilizados e melhorados, mas este é só indiretamente o propósito de Deus, e não seu fim imediato; o fim imediato do Evangelho é a salvação do povo que Ele ordenou para a vida eterna, e que portanto, em seu tempo, é conduzido a crer nEle. O mundo, até o fim, estará em inimizade com os verdadeiros crentes, como sempre esteve. Porque “não sois do mundo, antes eu os escolhi do mundo, por isso o mundo vos aborrece”. Isto será tão certo quando Cristo vier, como o é neste momento presente. Devemos esperá-lo; e quando nos enfrentarmos com o escárnio e perseguição, não nos surpreendamos como se algo estranho nos houvesse sucedido.


III. Vou observar, em terceiro lugar – Oh! Espero receber ajuda do alto – que O PECADO DE PREFERIR A BARRABÁS AO INVÉS DE CRISTO, FOI O PECADO DE CADA UM DE NÓS ANTES DA NOSSA CONVERSÃO.
Passem agora as páginas de seus diários pessoais, queridos amigos, ou voem sobre as asas da memória ao oco da pedra de onde foram arrancados. Oh, vocês que vivem perto de Cristo, não o desprezaram uma vez? Em qual companhia lhes dava mais prazer estar? Acaso não era a companhia das pessoas frívolas, não era a da gente profana? Quando se juntavam com o povo de Deus, sua prática era muito tediosa; se falavam de realidades divinas, ou de temas práticos, não os entendiam, e lhes percebiam problemáticos.
Posso ver no tempo a alguns que sei que são agora veneráveis crentes, mas que antes considerava como uma bruta moléstia quando os ouvia falar das coisas de Deus. Sobre o quê versavam nossos pensamentos? Não meditávamos muito sobre a eternidade; nem muito sobre Ele, que veio para libertar-nos do suplício dos tormentos do inferno.
Irmãos, Seu grande amor com o qual nos amou nunca foi introduzido em nossos corações como deveria; e mais, quando líamos a história da crucificação, não tinha mais efeito sobre nossa mente do que um conto comum. Não conhecíamos as belezas de Cristo; pensávamos em qualquer trivialidade antes que nEle. E quais eram nossos prazeres? Quando tínhamos o que chamávamos o disfrute de um dia, onde o buscávamos? Acaso ao pé da cruz? No culto do Salvador? Em comunhão com Ele? Longe disso; quanto mais pudéssemos nos afastar das associações piedosas nos sentíamos melhor.
Alguns de nós temos de confessar envergonhados de que nunca estávamos mais em nosso elemento do que quando estávamos desprovidos de consciência, quando a consciência havia cessado de acusar-nos e podíamos afundar-nos no pecado desenfreadamente. Qual era a nossa leitura então? Qualquer livro antes que a Bíblia: e se houvesse estado em nosso caminho algum livro que exaltasse a Cristo e o enaltecesse em nosso entendimento, haveríamos encurralado esse libro por ser demasiado árido para que nos pudesse agradar. Qualquer montão de insensatez encadernado em três volumes, qualquer literatura leve, e mais, talvez coisas piores, haveriam deleitado nossos olhos e nosso coração; mas os pensamentos do Seu eterno deleite até nós; os pensamentos de Sua paixão incomparável e agora de Sua glória no céu, nunca passaram por nossas mentes, nem podíamos suportar aos indivíduos que nos conduzissem a tais meditações.
Quais eram nossas aspirações? Cuidávamos do negócio, procurando fazer-nos ricos, famosos por nossos conhecimentos e admirados por nossa habilidade. Vivíamos para o eu. Se tínhamos alguma consideração pelos demais, e algum desejo de beneficiar a nossa raça, o eu sempre estava no fundo de tudo.
Não vivíamos para Deus; não podíamos dizer honestamente quando nos despertávamos nas manhãs: “espero viver hoje para Deus.” Pela noite, não podíamos ver a retrospectiva do dia, e dizer: “neste dia servimos a Deus”. Ele não estava em todos os nossos pensamentos. A quem rendíamos nosso melhor louvor? Louvávamos a Cristo? Não; louvávamos o talento, e quando estava associado com o pecado, seguíamos louvando da mesma forma. Admirávamos a aqueles que podiam ministrar mais plenamente a nossos próprios deleites carnais, e sentíamos o maior amor por aqueles que nos causavam maior dano. Acaso não é esta nossa confissão quando revisamos o passado? Acaso não acabo de ler a própria história da sua vida? Eu sei que li a minha. Ai! Lamentamos aqueles escuros dias nos quais nossa alma assediada perseguia qualquer forma de mal, mas não queria seguir a Cristo.
Haveria sucedido o mesmo conosco hoje, se a graça onipotente não tivesse estabelecido a diferença. Poderíamos esperar que o rio cessasse de correr ao mar, do que esperar que o homem natural navegasse contra a corrente de seus pecados. Poderíamos esperar que o fogo se tornasse água, ou que a água se tornasse fogo, do que esperar que o coração não regenerado amasse a Cristo alguma vez. Foi a graça poderosa que nos conduziu a buscar ao Salvador. E quando considerarmos nossas vidas passadas, será com sentimentos mesclados de gratidão pela mudança, e de tristeza por termos sido tão crassamente insensatos como para termos escolhido a Barrabás, e termos dito do Salvador: “Seja crucificado!”.
IV. E agora vou chegar à conclusão do sermão, que é: QUE HÁ INDUBITAVELMENTE MUITOS AQUI QUE NESTE DIA PREFERAM A BARRABÁS E NÃO AO NOSSO SENHOR JESUS CRISTO.
Primeiro, queridos amigos, permitam-me expor o vosso caso. Quero descrevê-lo honestamente, mas ao mesmo tempo, descrevê-lo de tal maneira que possam ver seu pecado nele; e enquanto estou fazendo isto, meu objetivo será debater com vocês, para o Senhor transformar a sua vontade.
Há muitos aqui, temo, que preferem o pecado antes de Cristo. Poderia dizer, sem necessidade de adivinhar, que eu sei que há alguns aqui que seriam seguidores de Cristo há muito tempo, mas preferiram a bebedeira. Não é sempre, não é a cada dia, não é nem sequer a cada semana, mas há ocasiões quando eles sentem como se devessem reunir-se com os amigos, e como resultado inevitável, regressam a casa intoxicados. Eles se envergonham deles mesmos; chegaram a expressar isto; chegaram tão longe como para orar a Deus pedindo graça para vencer seu hábito; mas depois de experimentar convicções durante anos, não avançaram até o momento. Uma vez pareceu como se tivessem vencido. Durante muito tempo houve uma abstinência desse vício, mas regressaram para a sua necessidade. Preferiram esse bestial vício degradante. Disse bestial? Insulto às bestas, pois não são culpáveis de vícios como esse. Eles preferem este vício degradante do que a Jesus. Ali está a bebedeira, a vejo refletida diante de mim com toda a sua insensatez, com sua avidez e sua imundícia; mas o homem escolhe tudo isso, e ainda que tenha conhecido mentalmente algo relativo à beleza e excelência de Cristo, virtualmente diz de Jesus: “Não a este homem, senão à embriaguez”.
Logo há outros casos, nos quais uma lascívia favorita reina suprema em seus corações. Os homens conhecem o mal do pecado, e têm uma boa causa para conhecê-lo; eles também conhecem algo da doçura da religião, pois nunca estão mais felizes do que quando se reúnem com o povo de Deus; e às vezes regressam para casa depois de um solene sermão, especialmente se faz referência ao seu vício, e sentem: “Deus falou à minha alma hoje e sou conduzido para um lugar mais alto”. Mas apesar disto, a tentação vem outra vez, e caem como caíram antes. Temo que há alguns de vocês a quem nenhum argumento convencerá jamais; ficaram tão firmes sobre este mal que será sua eterna ruína. Mas, oh! Pensem como se verá isto quando estejam no inferno: “Eu preferi a esse malvado Barrabás da lascívia, ao invés das belezas e das perfeições do Salvador, que veio ao mundo para buscar e salvar isso que estava perdido!”. E contudo, este é o caso, não de alguns, senão de uma grande multidão que ouve o Evangelho, e preferem o pecado e não o poder salvador desse Evangelho.
Pode haver algumas pessoas aqui, também, de outro tipo, que preferem as ganâncias. Se reduz a isto: se realmente se convertem no povo de Deus, não poderiam fazer no negócio o que agora pensam que o seu negócio requer que façam; se verdadeiramente se converteram em crentes, se tornarão, por suposto, honestos, mas seu negócio não renderia – dizem eles – se fosse manejado sobre princípios honestos; ou é um negócio de tal natureza – e há uns quantos desse tipo – que não deveriam se fazer em absoluto, e muito menos por parte de cristãos.
Aqui vem o ponto de inflexão. Tomarei o ouro, ou tomarei a Cristo? É certo que se trata de ouro enferrujado, e ouro sobre o qual há de sobrevir uma maldição. É o denário do néscio; talvez seja o lucro que é arrebatado das misérias do pobre; é dinheiro que não poderia suportar jamais a luz porque não foi obtido justamente; dinheiro que abrirá passo com fogo até suas almas quando estejam em seu leito de morte; mas os homens que amam o mundo dizem: “Não, Cristo não, me deem uma bolsa cheia e fora com Cristo”.
Outros, mais baixos ou menos honestos, clamam: “conhecemos Sua excelência, desejaríamos poder obtê-lo, mas não podemos obtê-lo nos términos que impliquem à renúncia de nossa muito amada ganância”. “Não a este, senão a Barrabás”.
Outros dizem: “eu anseio ser um cristão, mas então perderia a muitíssimos conhecidos e amigos. Em resumo, meus amigos não são bons para mim; são amigos que são muito afetuosos quando tenho uma boa quantidade de dinheiro para gastar com eles, são amigos que me louvam muito mais frequentemente quando me encontro no restaurante, quando me aprofundo em seus vícios. Sei que me fazem mal, mas” – diz o homem – “não poderia aventurar-me a me opor a eles. Um deles é tão língua solta, e pode dizer umas piadas tão prejudiciais que não gostaria de tê-lo contra mim, e há outro que ouvi dizer que põe apelidos tão incisivamente mordazes aos cristãos, e lhes assinala suas faltas de uma maneira tão sarcástica, que não poderia sofrer a crítica de sua língua, e, por isso, ainda que anseio ser um cristão, não poderei ser.
Dessa maneira preferes ser um servo da terra de labor, um escravo da língua do escarnecedor, antes que ser um homem livre, e tomar a cruz e seguir a Cristo. Preferes, digo, não simplesmente à maneira da alegoria, senão como um fato real, preferes a Barrabás do que ao Senhor Jesus Cristo.
Assim poderia multiplicar os exemplos, mas o mesmo princípio corre através de todos eles. Se há algo que lhes impeça de entregar seu coração ao Senhor Jesus Cristo, são culpáveis de levantar em sua alma um candidato de oposição ao Cristo, e vocês estariam escolhendo: “Não a este, senão a Barrabás”.
Permitam-me ocupar uns quantos minutos argumentando a causa de Cristo com vocês. O quê rejeitam de Cristo? Não estão conscientes das muitas coisas boas que recebem dEle? Estariam mortos se não fosse por Ele; e mais, pior que isso, estariam no inferno. Deus afiou o grande machado; a justiça, como um severo lenhador, esteve com o machado levantado, pronto para cortá-los como um estorvo que inutiliza a terra. Se viu uma mão que deteve o braço do vingador, e uma voz se escutou dizendo: “Deixe-a ainda este ano, até que eu cave ao redor dela e a abone”.
Quem foi o que apareceu justo então, em teu momento de necessidade extrema? Não foi outro senão esse Cristo, de quem pensas tão pouco que preferes à embriaguez ou o vício do que a Ele! Estás neste dia na casa de Deus, escutando um sermão que espero que provenha dEle. Poderias estar no inferno – pensa um instante nisso – com a esperança perdida, suportando em corpo e alma dores indizíveis. Que não estejas ali deveria te fazer amar e bendizer à Aquele que disse: “Livra-lo de descer à fossa”. Por quê haverias de preferir teu próprio lucro e tua autocomplacência do que a esse Ser bendito a quem deves tanto? A gratidão comum deveria te conduzir a negar-te algo a ti mesmo por Ele, que tanto se negou a Si mesmo para poder te abençoar.
Acaso te ouço dizer que não podes seguir a Cristo porque Seus preceitos são demasiados severos? Se você mesmo tivesse que julgá-los, qual é o ponto ao que lhe encontrarias alguma falha? Te negam teus pecados, digamos que te negam tuas desventuras. De fato não te permitem que te arruínes a ti mesmo. Não há nenhum preceito de Cristo que não seja para o teu bem, e não há nada que te proíba, que não o condene baseado no princípio que te causaria um dano se te entregasses a isso.
Mas ainda supondo que os preceitos de Cristo sejam muito severos, não seria melhor que te submetesses a eles em lugar de te arruinares? O soldado se submete implicitamente à ordem do capitão, porque ele sabe que sem disciplina não pode existir vitória, e o exército inteiro poderia ser destroçado se houvesse falta de ordem. Quando o marinheiro arriscou sua vida para penetrar através do denso gelo do norte, o encontramos dando seu consentimento a todas as ordens e regulamentações da autoridade, e suportando todas as durezas da aventura, porque é movido pelo desejo de ajudar em um grande descobrimento, ou por estímulo de uma grande recompensa.
E em verdade as pequenas abnegações para as quais Cristo nos chama, serão abundantemente recompensadas pelo prêmio que Ele oferece; e quando estão em jogo a alma e seus interesses eternos, bem podemos tolerar estas inconveniências temporais, se podemos herdar a vida eterna.
Me parece que te ouço dizer que gostarias de ser um cristão, mas que não há felicidade alguma nisto. Eu te diria sem nenhuma falsidade sobre este ponto e te diria a verdade se assim fosse, mas declaro solenemente que há mais gozo na vida cristã do que há em qualquer outra forma de vida, que se tivesse que morrer como um cão, e não houvesse algo além mais, preferiria ser um cristão. Poderias apelar aos mais indigentes entre nós, a aqueles que estão mais enfermos e são mais desprezados, e te diriam o mesmo. Não há uma só mulher do campo, que esteja tremendo dentro de seu velho abrigo rubro e gasto junto a uma pequena fogueira, cheia de reumatismo, com uma dispensa vazia e um corpo envelhecido, que trocaria seu lugar com o mais elevado e o maior de vocês se tivesse que renunciar sua religião; não, ela te diria que seu Redentor é um maior consolo para ela do que todos os luxos que pudessem ser amontoados sobre a mesa do homem rico. Cometes um erro quando sonhas que meu Senhor não faz bem-aventurados a Seus discípulos; as pessoas que põe sua confiança em Cristo são bem-aventuradas.
Todavia me parece que te ouço dizer: “sim, tudo isso está muito bem, mas ainda assim prefiro o prazer presente”. Não estás falando isto como uma criança; e mais, não falas como um néscio, pois o que é o prazer presente? Quanto tempo dura essa palavra “presente”? Se pudesses contar com dez mil anos de júbilo, poderia estar de acordo contigo em alguma medida, mas ainda nisso teria pouca paciência contigo, pois o que serão dez mil anos de diversão no pecado, comparados com milhares milhões de anos de castigo pelo pecado? Vamos, ainda sendo a maior possível, tua vida será muito breve. E não estás consciente de que o tempo voa mais rapidamente a cada dia? Conforme envelheces, não te dá a impressão que viveste um tempo mais curto ao invés de mais longo? E ao fim, se pudesses viver até chegar a ser tão velho como Jacó, dirias: “pouco e maus foram os dias da minha vida, pois dão a impressão de serem poucos apesar de serem numerosos”.
Tu sabes que esta vida não é senão um momento, e logo acaba. Veja os cemitérios, e observe como estão povoados de verdes montes. Recorda aos teus próprios companheiros, como um a um foram falecendo. Eles eram tão firmes e fortes como você, mas se foram como uma sombra. Vale a pena ter este breve espaço de prazer e logo estar submergido em eterna dor? Te suplico que respondas a esta pergunta. Vale a pena escolher a Barrabás por motivo de alguma ganância temporal que possa proporcionar-te, e renunciar a Cristo, e assim renunciar aos eternos tesouros de gozo e felicidade que estão a Sua destra para sempre?
Eu gostaria de poder lhes fazer estas perguntas como devem ser feitas. Se requer a impetuosa voz seráfica de Whitefield, ou a suplicante língua de Richard Baxter, para suplicar-lhes, mas contudo, penso que falo com homens racionais; e caso se tratasse de um assunto de aritmética, não necessitaria das minhas palavras. Não te pedirei que calcules teu prognóstico de vida mais otimista – digamos oitenta anos – e preenchas esse lapso com todos os prazeres que possas imaginar; supondo que gozes de boa saúde; sonhe que não tens preocupações de negócios, e que possui tudo o que o coração possa desejar, anda e senta-te no trono de Salomão, se assim o queres, e contudo, o que terás para dizer quando tudo acabe? Vendo em retrospectiva, poderias dizer algo mais do que Salomão disse, quando afirmou: “Vaidades de vaidades, tudo é vaidade,” e “Tudo isso é vaidade e aflição de espírito”? Quando houveres calculado essa suma, posso pedir-te que calcules quanto haverás ganhado, se para possuir esta vaidade, terás renunciado à felicidade eterna, e incorrido na condenação eterna?
Crês na Bíblia? Respondes: “sim”. Bem, então, assim há de ser. Muitos homens professam crer na Escritura, e contudo, quando chegam ao ponto relativo a se creem de verdade na condenação eterna e na bem-aventurança eterna, há uma espécie de algo dentro que sussurra: “isso está no Livro, mas ainda assim não é real, não é válido para nós”. Façam-no válido para vocês, e quando tiverem feito isso, e tiverem provado claramente que devem estar na bem-aventurança ou na condenação, e que aqui vão ter a Barrabás como seu amo ou ter a Cristo como seu Senhor, então, digo, como homens sãos, julguem qual é a melhor escolha, e que a poderosa graça de Deus lhes dê sanidade espiritual para fazer a escolha correta, mas isto sim sei: nunca farão isso a menos que esse poderoso Espírito – que é o único que nos guia a escolher o bom, e rejeitar o mal – venha sobre vós e os conduza a acudir rapidamente às feridas de um Salvador.
Creio que não necessito prolongar o culto agora, mas espero que vocês o prolonguem em suas respectivas casas, refletindo sobre este assunto. E me permitem fazer-lhes pessoalmente uma pergunta a todos ao retirarem-se: a quem vocês pertencem? De qual lado vocês estão? Não há posições neutras; não há pontos médios: ou servem a Cristo ou servem a Belial; ou estão com o Senhor ou estão com Seus inimigos. Quem está do lado do Senhor neste dia? Quem? Quem está por Cristo e por Sua cruz; por Seu sangue, e por Seu trono? Quem, por outro lado, são seus inimigos? Todos os que não estejam por Cristo são contados entre Seu inimigos. Não sejam contados mais entre eles, pois o Evangelho vem a vocês com voz convidativa: “Crê no Senhor Jesus Cristo, e serás salvo”. Que Deus te ajude a crer e a apoiar-te nEle agora; e se confias nEle, és salvo agora, e serás salvo para sempre. Amém.
ORE PARA QUE O ESPIRITIO SANTO USE ESSE SERMÃO PARA EDIFICAÇÃO DE MUITOS E SALVAÇÃO DE PECADORES.


FONTE
Todo direito de tradução protegido por lei internacional de domínio público

Sermão nº 595— BARABBAS PREFERRED TO JESUS-  do volume 10 do TheMetropolitan Tabernacle Pulpit,
Tradução: Junior Rubira
Revisão: Armando Marcos Pinto

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